O Caminho do Sal está situado na Região Metropolitana de São Paulo, em área de remanescentes do bioma Mata Atlântica, de grande variabilidade territorial, topográfica e climática. Eu, curioso por conhecer esse paraíso ecológico, fui percorrer o roteiro, cujos 52 quilômetros eu venci a pé, em duas etapas. Um pouco do que vivenciei nos dois dias em que caminhei por essa região, poderá ser visualizado nos links abaixo.
1º dia: TRECHO DO ZANZALÁ (15,5 km) + CARVOEIRO (10 km) – 25,5 quilômetros
Para ver/gravar essa trilha no WIKILOC, acesse: https://pt.wikiloc.com/trilhas-trekking/caminho-do-sal-zanzala-e-carvoeiros-23503588
Trecho do ZANZALÁ
Início: Rodovia Caminhos do Mar, km 38,1 (São Bernardo do Campo)
Fim: Rodovia Adib Chamas-SP 122, km 43,2 (Santo André)
Em aproximadamente 15 km, o trecho Zanzalá resgata uma parte do traçado original do Caminho do Zanzalá, caminho de tropeiros aberto em 1640 para transporte de sal do porto de Santos até Mogi das Cruzes. O período é marcado pelo crescimento da Vila de São Paulo e, consequentemente, da demanda pelo abastecimento de sal, produto estratégico para a sobrevivência dos povoamentos. Á época, o sal era monopolizado pelo governo português, que desembarcava o produto nos portos de Santos e São Vicente. Seu transporte até o planalto era realizado através do Caminho do Padre José Anchieta, que atravessa a Serra do Mar e se estende em direção ao interior do estado, e dali seguia pelo Caminho de Zanzalá. Por três séculos, o Zanzalá foi a principal rota de ligação entre os atuais municípios de São Bernardo do Campo e Mogi das Cruzes. Mais tarde esse caminho também foi utilizado para contrabando de pedras preciosas oriundas das minas de Cuiabá, Mato Grosso, uma vez que tropeiros desviavam por ali para escapar dos altos impostos cobrados pela coroa portuguesa. Em 13 de maio de 1722, o rei de Portugal ordenou a vedação do Caminho de Zanzalá, ficando a rota esquecida e obscura.
Margeando o Parque Estadual da Serra do Mar você avistará o Oleoduto da Serra, primeiro do gênero no Brasil, além de belas paisagens; percorrerá longos trechos com vista para o Reservatório Billings, atravessará a Barragem do Sangradouro do Pequeno Perequê, córregos, rios e lagoas de águas castanhas cercados por campos nativos, e ainda poderá observar a fauna e flora locais.
Este trecho tem poucas propriedades rurais e nele não é possível encontrar praticamente nenhuma infraestrutura de comércio e serviços, por isso, programe-se bem antes de iniciá-lo.
Atrativos do trecho
Rodovia Caminhos do Mar - O Caminho do Sal tem início/fim na Rodovia Caminhos do Mar, km 38,1, em São Bernardo do Campo. A rodovia, que leva à entrada do Núcleo ItutingaPilões do Parque Estadual da Serra do Mar, também é conhecida como Rota do Peixe. Oferece diversos serviços que vão de clubes de campo a restaurantes e locais para prática de esportes como Stand Up Paddle, caiaque, cavalgada, etc. Na estrada, você encontra diversos locais para estacionamento, lanches rápidos, petiscos e refeições completas. Além disso, há espaços para prática de pesca tanto na represa quanto em pesqueiros, e você pode aproveitar para levar a família, pois sempre há atividades, ciclistas e corredores treinando na rodovia.
Parque Estadual da Serra do Mar – Núcleo Itutinga-Pilões - Possui enorme diversidade de fauna e flora sob Proteção Integral, além de variados monumentos de importância histórica que remontam à colonização do Brasil. Protege toda a região de escarpas da Serra do Mar, se estendendo até o litoral paulista. As atividades no parque acontecem mediante agendamento. É possível fazer uma caminhada entre São Bernardo do Campo e Cubatão, quando os monumentos podem ser visitados e eventualmente se pode avistar o mar.
Sangradouro do Perequê e Represa Billings - O Rio Perequê é um dos contribuintes da Billings, que começou a ser construída em 1925, e foi inundada em 1927, para gerar energia elétrica para as indústrias de Cubatão. Desde 1958, é utilizada para abastecimento de água no ABC e em São Paulo. O Sangradouro é uma pequena barragem de controle e fica na Estrada Mogi das Cruzes, no Caminho do Sal, em São Bernardo do Campo. A construção tem mais de meio século.
Oleoduto da Serra - Esse é o primeiro oleoduto do gênero no Brasil, instalado em 1948 pela Estrada de Ferro Santos-Jundiaí, atualmente administrado pela Petrobrás. Ao percorrer o Caminho do Sal, ele poderá ser avistado algumas vezes, no lado direito do caminho, sentido Taiaçupeba, ou lado esquerdo, sentido Rodovia Caminhos do Mar.
Sete Tubos, outros córregos e lagoas - Sete tubos é um lago artificial formado pelas águas castanhas de um afluente da margem direita do Rio Pequeno, que forma um dos principais braços do Reservatório Billings. As nascentes que alimentam este lago ficam a cerca de 1500 m dali e estão nas bordas do Parque Estadual da Serra do Mar. Escoando em meio à mata, onde não há qualquer ocupação urbana, as águas assumem uma coloração própria da presença de matéria orgânica, proveniente vegetação e camadas superficiais do solo (daí a cor castanha da água). Você encontrará vários córregos e lagos ao longo do percurso, sendo que este é um dos mais indicados para banho.
Fonte: http://www.saobernardo.sp.gov.br
Trecho do CARVOEIRO
Início Rodovia Adib Chamas-SP 122 km 47,3 (Santo André)
Fim: Avenida Fford - s/n (Vila de Paranapiacaba)
A inauguração da estação ferroviária do Campo Grande, em 1889, pela São Paulo Railway Company, criou as condições necessárias para o extrativismo de madeira que alimentava os fornos das olarias dos núcleos coloniais de Ribeirão Pires e de São Caetano do Sul; e também contribuía com a produção de carvão que atendia às demandas do acelerado crescimento da capital paulista e de Santos. A estação de trem do Campo Grande, em Santo André, nas proximidades da Vila de Paranapiacaba, que no projeto da estrada de ferro tinha por objetivo apenas ser uma parada intermediária para o abastecimento de água para as locomotivas, vai, gradativamente, assumindo a função de escoar a produção de lenha e carvão. Toda essa área devastada, no passado, está hoje em franco processo de regeneração e sua história pode ser resgatada por meio do Trecho dos Carvoeiros, em aproximadamente 10 km de extensão. Você percorrerá estradas entre matas, avistará monumentos, e encontrará a encantadora Vila Ferroviária de Paranapiacaba no alto da Serra do Mar.
Atrativos do trecho
Reserva Biológica do Alto da Serra de Paranapiacaba - Localizada na Rod. Deputado Antônio Adib Chamas (SP 122), km 51, já nos limites de Santo André, é a primeira Estação Biológica da América do Sul, tendo sido criada em 1890 pelo pesquisador alemão Hermann Friederich Albrecht von Ihering, também responsável pela criação de diversos museus no Brasil e no mundo. Em 1986 a reserva ganhou decreto estadual e recebeu o nome atual. A área é predominantemente de Mata Atlântica, com enorme diversidade em espécies vegetais. A reserva é uma Unidade de Proteção Integral e por isso destina-se somente ao desenvolvimento de pesquisas e de atividades educacionais.
Estrada de Ferro Santos–Jundiaí - A Estrada de Ferro Santos-Jundiaí foi a primeira a ser construída em São Paulo, com obras iniciadas em 1860 e inauguração em 1867. Financiada com capital inglês, a partir de uma série de negociações desenvolvidas por Barão de Mauá, na ocasião recebeu o nome de São Paulo Railway (SPR). A ferrovia deveria cumprir o papel de facilitar a exportação e escoamento da produção cafeeira do interior do estado e durante 90 anos foi explorada pelo capital inglês, até ser estatizada em 1946. Também foi responsável pelo transporte de passageiros ao litoral durante anos. Atualmente, na região do Caminho do Sal, circulam trens de carga, que cortam as estações de Campo Grande e Paranapiacaba e o Expresso Turístico, que funciona apenas aos finais de semana.
Estação Ferroviária Campo Grande - Inaugurada em 1889, pela São Paulo Railway Company, desde sua criação, a Estação de Campo Grande nunca teve muito movimento de passageiros. Contudo, era um ponto fundamental de parada e estacionamento de trens para escoamento da produção de carvão e madeira, que servia à região. A antiga passarela e o prédio da estação são referências da época que ainda teimam em resistir, já que desde a década de 1990 nenhum passageiro desembarca por ali.
Mirante em Campo Grande, Monumento ao Divino Redentor e Capela do Bom Jesus da Boa Viagem - O mirante de Campo Grande, o monumento e a capela podem ser acessados por uma estreita estrada de terra, em frente à casa da Reserva Biológica do Alto da Serra, na Rod. Deputado Antônio Adib Chamas (SP 122) - Km 51. Do topo do morro é possível ter uma bela vista, em dias claros, da Estação de Campo Grande e do entorno. A Capela do Bom Jesus da Boa Viagem foi construída pelo padre Luiz Capra e inaugurada em 1912. Lá foram celebrados missas e casamentos. Conta-se que por ocasião de um longo período de chuva, um tiro foi deflagrado contra a estatueta do Divino Salvador, que fica no topo da capela. Dois dedos da mão da estátua foram destruídos e após isso, o sol voltou a imperar, lenhadores e carvoeiros puderam enfim voltar ao trabalho.
Vila de Paranapiacaba - Antiga vila ferroviária de arquitetura inglesa, criada no final do século XIX, no topo da Serra do Mar, onde atrativos históricos, culturais e naturais estão por todos os lados. Em princípio, tratava-se apenas de um canteiro de obras, necessário à implantação da ferrovia, onde viviam operários. O sistema funicular, originalmente implantado na ferrovia, exigia constante manutenção e na década de 1970 foi trocado pelo cremalheira aderência, diminuindo a necessidade de mão de obra. Nesse período, operários foram gradativamente deixando a vila. Paranapiacaba significa em tupi, lugar de onde se avista o mar. E além da colonização inglesa, fortemente marcada pela arquitetura, também recebeu colonização portuguesa. As construções de padrão mais comum ao olhar brasileiro, ficam do outro lado da ferrovia e são uma atração à parte. O caminho cruza a Vila Inglesa e de lá, por meio de uma passarela, é possível acessar o lado de colonização portuguesa. Paranapiacaba conta com uma série de atrações como museus, monumentos históricos, restaurantes, hotéis e paisagens incríveis, além de vários festivais ao longo do ano.
Fonte: http://www.saobernardo.sp.gov.br
2º dia: TRECHO DO BENTO PONTEIRO – 27,5 quilômetros
Para ver/gravar essa trilha no WIKILOC, acesse: https://pt.wikiloc.com/trilhas-trekking/caminho-do-sal-prp-x-taiacupeba-24235108
Início: Avenida Fford s/n (Vila de Paranapiacaba)
Fim: Praça Cipriano Branco da Silva - Igreja Matriz (Vila de Taiaçupeba)
Conhecido como “Ponteiro”, por ser construtor de pontes na mocidade, Bento José da Silva foi um dos primeiros habitantes do Alto da Serra, atual Paranapiacaba. Bento José Rodrigues da Silva era um comerciante português possuidor de terras em Mogi das Cruzes, que atraído pela notícia da construção da estrada de ferro pelos ingleses, abriu um carreiro de alguns quilômetros, desde Quatinga até a vereda do acampamento das obras da ferrovia. Chegou ao fim de seu empreendimento em 1862; e passou a morar num rancho de pau-a-pique no alto do morro, recebendo do governo uma porção de aproximadamente 40 alqueires. A gleba foi dividida e se instalaram nela moradias e comércios de gêneros necessários ao acampamento. Religioso, doou as terras onde hoje estão o cemitério e a Igreja do Bom Jesus de Paranapiacaba. No trecho mais longo do Caminho do Sal, com cerca de 27 km, você atravessará belas paisagens rurais, conhecerá a Vila de Taquarussu, a pequenina Quatinga, e encontrará Taiaçupeba, um charmoso distrito de Mogi das Cruzes, cercado de muitos atrativos naturais.
Atrativos do trecho
Vila de Taquarussu - A Vila de Taquarussu está localizada no município de Mogi das Cruzes e foi construída por trabalhadores italianos, durante a II Guerra Mundial, na Fazenda de Taquarussu, uma propriedade particular. A fazenda fornecia lenha e carvão para as locomotivas da São Paulo Railway. Ao passar por ali, o caminho faz um pequeno desvio por fora da área construída, porém é possível avistar as edificações da época, uma capela construída em homenagem à Santa Luzia e um pequeno lago. Na vila também há fonte de abastecimento de água potável.
Aqueduto -As grandes tubulações que podem ser avistadas na superfície, nesse trecho do caminho, são parte do Sistema Adutor Rio Claro, que atualmente abastece cerca de 1,5 milhão de pessoas na Região Metropolitana de São Paulo. O primeiro trecho da adutora foi lançado em 1939 e após duplicação na década de 1970, devido ao aumento da demanda por água na região, passou a contar com 86 km de extensão. A complexidade da obra é tão grande, que vários tipos de tubulação foram utilizados, e algumas peças foram importadas da Inglaterra.
Quatinga - Distrito de Mogi das Cruzes, cercado pela Serra do Mar. Nas proximidades do distrito, do topo da Pedra Grande, numa afloração de granito, que faz parte do compartimento da serra, avista-se o litoral em dias de céu aberto. Na pequena vila, a Igreja de Nossa Senhora da Piedade foi erguida na década de 1950. Lá você pode encontrar alguns poucos comércios, serviços e linhas de ônibus municipais que levam até a região central de Mogi.
Taiaçupeba - Distrito de Mogi das Cruzes, sua colonização data de 1864, quando passou a ser utilizado por bandeirantes para repouso e acampamento. A maior parte do seu território está em área de Mata Atlântica. Seu nome se deve à presença de porcos selvagens, os queixadas, espécie nativa da região, chamados TAI (dente) ASSU (grande) PEBA (branco) pelos indígenas. A igreja Matriz de Taiaçupeba ou Paróquia Santa Cruz é o ponto final/inicial do caminho, foi reformada e redecorada com pinturas de José Benedito da Cruz (conhecido como JBC), por volta do século XIX.
Parque das Neblinas - O Parque das Neblinas é uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) gerido por uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) e mantido por uma empresa produtora de papel e celulose. Com cerca de 2800 ha, o parque oferece diversas atividades que tem foco na criação de estratégias socioambientais de conservação da Mata Atlântica. Apesar dos claros resquícios da produção de eucaliptos, a mata está em avançado estágio de recuperação e há trilhas autoguiadas e monitoradas, trilha para cicloturismo, canoagem, cachoeiras, arvorismo e outras atividades, sempre mediante agendamento. O parque fica bem pertinho da Igreja da Matriz, no distrito de Taiaçupeba.
DICAS FINAIS
COMO CHEGAR AO PONTO INICIAL, EM SÃO BERNARDO DO CAMPO: Siga de carro ou de bicicleta até a Rodovia Caminhos do Mar (SP-148), km 38,1, onde tem início a rota. Procure estabelecimentos comerciais ao longo da rodovia, onde possa estacionar. Se for de transporte público, aos finais de semana, ônibus partem do Terminal do Riacho Grande até o início do caminho ou parte dele, com intervalos de 1:30 a 2:00 h. As linhas são 61A Parque dos Lagos ou 61A Direto. Para chegar ao terminal do Riacho, utilize as linhas 6, 29 ou 30, que passam nas regiões centrais da cidade, inclusive perto da Rodoviária Municipal. Obtenha mais informações no site da SBCTrans (www.sbctrans.com) ou pelos telefones (11) 4084-9000 / (11) 4335-0225.
Para maiores informações, acesse o GUIA oficial desse roteiro: http://www.saobernardo.sp.gov.br/documents/10181/20856/guia_ecoturismo_caminho_do_sal_otz.pdf/55ef3f33-6503-4b23-98e6-64dfc0ebb490
MINHA EXPERIÊNCIA NESSE CAMINHO
1º dia: TRECHO DO ZANZALÁ (14 km) + CARVOEIRO (10 km) – 24 quilômetros
Eu embarquei num ônibus em minha cidade e três horas mais tarde eu aportei no Terminal Rodoviário da cidade de São Bernardo do Campo, onde me hospedei no Líder Hotel.
No dia seguinte, eu tomei um táxi, que me levou ao ponto inicial do Caminho do Sal, localizado no km 38,1 da Rodovia Caminhos do Mar.
Nesse local, onde há uma placa indicativa mencionando o roteiro, eu apeei do veículo, fiz os acertos monetários com o motorista, depois, de mochila nas costas, animado, dei início à jornada daquele dia.
O clima se apresentava frio e nublado, e o caminho bastante molhado pelas chuvas recentes.
No primeiro trecho eu caminhei pelo interior do Parque Estadual da Serra do Mar, que possui enorme diversidade de fauna e flora sob Proteção Integral, além de variados monumentos de importância histórica que remontam à colonização do Brasil.
Uns 4 quilômetros adiante, por uma ponte, eu ultrapassei o Sangradouro do Perequê e Represa Billings, que começou a ser construída em 1925, e foi inundada em 1927, para gerar energia elétrica para as indústrias de Cubatão.
O seu sangradouro é composto por uma pequena barragem de controle, situada na Estrada Mogi das Cruzes, no Caminho do Sal, em São Bernardo do Campo.
Mais adiante, pude avistar algumas vezes, do meu lado direito, o Oleoduto da Serra, o primeiro do gênero no Brasil, instalado em 1948 pela Estrada de Ferro Santos-Jundiaí, atualmente administrado pela Petrobrás.
No primeiro trecho do trajeto existem alguns condomínios instalados e encontrei um razoável trânsito de veículos, em vista do horário matutino.
Porém, depois de percorrer 7 quilômetros, numa bifurcação, entrei à direita, então, tudo se tornou deserto e ermo, pois ali não há residências.
Infelizmente, por conta da forte chuva que assolara a região e em face da construção de um enorme gasoduto ao lado da estrada, encontrei o leito do caminho bastante convulsionado, com água e lama.
Contudo, depois de curtir intensamente o visual e sem maiores novidades, pois esse trecho é praticamente todo plano, 14 quilômetros superados, eu acessei à Rodovia Adib Chamas-SP 122, e prossegui pelo seu acostamento, num trajeto tranquilo, pois ela apresenta ínfimo tráfego de veículos.
Finalmente, 4 quilômetros à frente, eu adentrei à esquerda e segui mais 6 quilômetros pela Trilha Paranapiacaba Baixa, num percurso pleno de silêncio e muito ar puro.
Esse trecho, nominado de Rota dos Carvoeiros, é bem arborizado, com alguns ascensos e descensos, mas nada muito pronunciado.
Para ajudar, encontrei o leito da estrada bastante pilado, com poucas pedras e quase nada de lama.
No final, fui surpreendido pela cerração que tomou conta da paisagem, deixando tudo nebuloso e escuro.
E depois de pouco mais de 6 horas de caminhada, aportei em Paranapiacaba que, atualmente, é um distrito de Santo André.
Na charmosa vila fiquei hospedado na Pousada Maranata, que está localizada no enclave de colonização inglesa, cuja proprietária, a Dona Margareth, é extremamente simpática e zelosa para com os hóspedes.
Paranapiacaba é uma antiga vila ferroviária de arquitetura inglesa, criada no final do século XIX, no topo da Serra do Mar, onde atrativos históricos, culturais e naturais estão por todos os lados.
Em princípio, tratava-se apenas de um canteiro de obras, necessário à implantação da ferrovia, onde viviam operários.
O sistema funicular, originalmente implantado na ferrovia, exigia constante manutenção e na década de 1970 foi trocado pela cremalheira aderência, diminuindo a necessidade de mão de obra.
Nesse período, operários foram gradativamente deixando a vila.
Paranapiacaba significa em tupi, lugar de onde se avista o mar.
E além da colonização inglesa, fortemente marcada pela arquitetura, também recebeu colonização portuguesa.
As construções de padrão mais comum ao olhar brasileiro ficam do outro lado da ferrovia e são uma atração à parte.
O caminho cruza a Vila Inglesa e de lá, por meio de uma passarela, é possível acessar o lado de colonização portuguesa. Paranapiacaba conta com uma série de atrações como museus, monumentos históricos, restaurantes, hotéis e paisagens incríveis, além de vários festivais ao longo do ano.
População atual: Aproximadamente, 1 mil pessoas. Altitude: 818 m.
Depois de uma reparadora soneca, pela ponte metálica, ultrapassei novamente as vias férreas, e fiz uma visita na vila de colonização portuguesa, onde se situa a igreja matriz do distrito, cujo padroeiro é o Bom Jesus.
Por azar, garoa fria e o nevoeiro que se abateram sobre a povoação, deixaram o entorno neblinoso, o que não extraiu o charme da vila; no entanto, entendo que com sol, tudo ficaria mais belo e aprazível ao meu olhar de turista debutante naquele local.
E como não podia deixar de ser, no final do giro, fiz uma pausa na Padaria dos Mendes, onde provei da pinga com cambuci, um dos grandes atrativos desse inesquecível distrito.
Ali passei momentos únicos, proseando com o proprietário desse estabelecimento comercial, o Sr. Valderez, uma pessoa alegre e que emana simpatia.
RESUMO DO DIA - Tempo gasto, computado desde o início do Caminho, no km 38,1 da rodovia Caminhos do Mar, em São Bernardo Campo/SP, até a Pousada Maranata, em Paranapiacaba/SP: 5 h 15 min.
Clima: nublado/chuvoso, variando a temperatura entre 13 e 20 graus.
Pernoite: Pousada Maranata – Apartamento individual, com café da manhã – Banheiro Compartilhado - Preço: R$70,00 – Razoável!
Almoço: Bar da Zilda: Excelente! – Preço: R$25,00, prato individual.
Para visualizar essa trilha, gravada no aplicativo Wikiloc, acesse: https://pt.wikiloc.com/trilhas-trekking/estrada-caminho-do-mar-a-paranapiacaba-25547345
AVALIAÇÃO PESSOAL: Uma etapa de média extensão e de rara beleza na maioria de seu trajeto que foi, infelizmente, empanada pelo excesso de lama que encontrei na trilha. Contudo, não há no trajeto qualquer empecilho altimétrico de importância, o que permite ao caminhante desenvolver uma velocidade média constante. Na verdade, o trecho do caminho, nominado de Zanzalá, é muito bonito e interessante do ponto de vista de variações de terreno, posto que são 14 quilômetros com leves aclives e declives, lama, passagens com bastante pedregulho e outras planas, de terra batida. E ao longo desse primeiro trecho, encontrei várias pontes sobre córregos de água cristalina que formam poços com profundidade suficiente para um bom mergulho no verão. Além de excelentes vistas dos morros da serra do Mar, que bordejam o caminhante pelo lado direito. Já o trecho dos Carvoeiros é integralmente plano e, como todo o Caminho muito bem sinalizado. No geral, percurso de baixa dificuldade e de expressiva beleza. Recomendo!
2º dia: TRECHO DO BENTO PONTEIRO – 28 quilômetros
Início: Avenida Fford s/n (Vila de Paranapiacaba)
Fim: Praça Cipriano Branco da Silva - Igreja Matriz (Vila de Taiaçupeba)
O clima estava frio e chuvoso, assim, deixei o local de pernoite às 6 h, debaixo de uma impertinente garoa, mas que logo cessou.
O nevoeiro prosseguia intenso, por isso me guiei com a lanterna e o aplicativo Wikiloc, que eu baixara em meu aparelho celular, onde estava gravado o roteiro que eu seguiria.
O piso molhado, o ar frígido, o silêncio e a ermosidade marcaram esse meu primeiro trecho, até que, após 4 quilômetros percorridos, passei pela vila de Taquarassu.
Ela está localizada no município de Mogi das Cruzes e foi construída por trabalhadores italianos, durante a II Guerra Mundial, na Fazenda de Taquarussu, uma propriedade particular, que fornecia lenha e carvão para as locomotivas da São Paulo Railway.
Ao passar por ali, o caminho faz um pequeno desvio por fora da área construída, porém é possível avistar as edificações da época, uma capela construída em homenagem à Santa Luzia e um pequeno lago.
O roteiro prosseguiu ermo e desabitado, porém, diferentemente do dia anterior, não encontrei a pertinente sinalização e acabei me perdendo, pois existem várias bifurcações.
Depois de caminhar uns 10 quilômetros, encontrei com um senhor que me explicou detalhadamente como eu deveria fazer para me reencontrar com o Caminho do Sal.
Segui por estradas largas e após ladear as imensas instalações da Furnas Centrais Elétricas de Tijuco Preto, acabei por me enlaçar novamente com o roteiro original e, curiosamente, apesar do grande e desnecessário giro, caminhei apenas 1 quilômetro a mais em relação ao percurso correto.
Ainda assim, transitei por locais de expressiva beleza.
Em Quatinga, um distrito de Mogi das Cruzes, fiz uma pausa para descanso e hidratação, enquanto aguardava a chuva cessar.
Nas proximidades dessa povoação, do topo da Pedra Grande, uma afloração de granito que faz parte do compartimento da serra, avista-se o litoral em dias de céu aberto.
Na pequena vila, a Igreja de Nossa Senhora da Piedade foi erguida na década de 1950 e lá você pode encontrar alguns estabelecimentos comerciais, serviços e linhas de ônibus municipais que levam até a região central de Mogi.
A sequência foi por uma estrada bastante urbanizada e plena de chácaras, mas, depois de 4 quilômetros percorridos, numa bifurcação, eu adentrei à direita e vivenciei novamente o silêncio e a ermosidade, até a chegada ao distrito de Taiaçupeba, ponto final do caminho.
Sua colonização data de 1864, quando passou a ser utilizado por bandeirantes para repouso e acampamento, sendo que a maior parte do seu território está em área de Mata Atlântica.
Seu nome se deve à presença de porcos selvagens, os queixadas, espécie nativa da região, chamados TAI (dente) ASSU (grande) PEBA (branco) pelos indígenas.
A igreja Matriz de Taiaçupeba ou Paróquia Santa Cruz, o ponto final/inicial do caminho, foi reformada e redecorada com pinturas de José Benedito da Cruz (conhecido como JBC), por volta do século XIX.
Quanto ali aportei, posei para uma foto de recordação, depois tomei um ônibus e segui para Mogi das Cruzes, onde pernoitei.
E no dia seguinte, retornei ao meu lar.
RESUMO DO DIA - Tempo gasto, computado desde Paranapiacaba até o distrito de Taiaçupeba: 6 h.
Clima: nublado/chuvoso, variando a temperatura entre 12 e 19 graus.
Para visualizar essa trilha, gravada no aplicativo Wikiloc, acesse: https://pt.wikiloc.com/trilhas-trekking/paranapiacaba-a-taiacupeba-25571355
AVALIAÇÃO PESSOAL: Uma etapa de média extensão e de rara beleza na maioria de seu trajeto que foi, infelizmente, empanada pelo erro que cometi no 8º quilômetro, por total ausência de sinalização. Naquele local, onde existe uma bifurcação, eu deveria seguir à direita, mas não encontrei indicações nesse sentido e nem pessoas a quem pudesse indagar sobre o rumo correto. No entanto, apesar de prosseguir por outros caminhos, vivenciei paisagens maravilhosas, que compensaram sobejamente, com sua beleza e solidão, a ausência das flechas indicativas. No global, um trajeto tranquilo e, praticamente, sem nenhum obstáculo altimétrico. Porém, diferentemente da primeira etapa, praticamente, sem sinalização alguma.
FINAL
“Que a gente tenha: Astral bonito. Prece nos lábios. Saudade mansinha. Fé no futuro. Delicadeza nos gestos. Conversa que cura. Cotidiano enfeitado. Firmeza nos passos. Sonhos que salvam.”
(Caio Fernando Abreu)
Afinal de contas, o que realmente importa para que nos sintamos vivos e façamos com que a nossa existência adquira um sentido para nós mesmos, para os demais ou para o nosso entorno é a ação ou a ativação de nossos pensamentos.
Posto que, somos mais do que um pedaço de carne que respira e tem um ciclo de vida determinado que o leva a nascer, crescer, reproduzir-se às vezes e, no final, sucumbir e morrer.
Por isso são muitos os que não se contentam em falar da vida e pensar nela.
São aqueles que preferem caminhar pela natureza, em vez de vê-la em um atlas.
Aqueles que desfrutam mais de uma corrida ou uma experiência real do que de um jogo virtual.
Aqueles que entendem que o compromisso e a ação são mais importantes do que permanecer no mundo das ideias.
E, finalmente, são todos aqueles que querem viver a vida para se sentirem vivos.
Nesse sentido, veterano de muitos caminhos, diria com sinceridade, o Caminho do Sal me surpreendeu, positivamente, por sua beleza, exuberância e singularidade.
Em consonância, desfrutei paisagens deslumbrantes, conheci pessoas amistosas e hospitaleiras, percorri florestas preservadas, matas virgens, caminhos silenciosos, despoluídos e sem violência, na verdade, me senti em outro mundo.
Nesse contexto, trilhar esse roteiro evidenciou-se, para mim, como uma experiência instigante, prazerosa e inolvidável, que recomendo, com efusão.
Bom Caminho a todos!
Junho/2018