13º dia: BENTO RODRIGUES a OURO PRETO – 36 quilômetros

Aquele seria meu derradeiro dia no Caminho dos Diamantes e, por isso, acordei muito bem disposto. 

Assim, às 5 h, já estava no bar da Sandra saboreando o café escaldante e gostoso, gentilmente preparado pela minha anfitriã, que também madrugara.

Segundo ela, aquele ato desprendido não lhe impingia sacrifício algum, pois, todas as manhãs, mal raiava o dia, saía com uma amiga a caminhar pelos arredores do povoado.

Depois das despedidas habituais, bastante animado, deixei a pequena vila e logo acessei larga e plana estrada de terra batida. 

A cerração se fazia de tal modo espessa, que não se podia enxergar a mais de dez metros à frente.

Porém, valendo-me de minha lanterna, contornei uma grande área cercada do Hotel Fazenda Aconchego do Campo e, logo adiante, encontrei uma bifurcação: se seguisse à direita, iria diretamente à Mariana. 

Contudo, obedecendo os marcos da Estrada Real, entrei, à esquerda, e logo iniciei suave ascenso, por um caminho bastante arborizado.

Lentamente, a luz do dia foi surgindo, sem pressa, apagando a Via Láctea que durante horas ficara desenhada no céu. 

Um punhado de estrelas cintilantes ainda insistia em enfeitar o firmamento arroxeado,  com tons dourado e alaranjado. 

Hoje, encerrarei minha aventura no Caminho, matutava, enquanto andava por um chão irregular. 

Não sei porque, mas, ao invés de alegria, comecei a sentir uma estranha e pungente tristeza. 

Mil pensamentos se confundiam em meu cérebro, como um filme que passasse acelerado, sem controle...

 Algumas elucubrações me assaltavam: Por que caminhamos, afinal? 

Por que não nos conformamos com o conforto de nosso lar, ao lado de nossa família? 

Ou por que, já que queremos nos evadir, não nos integramos a um pacote turístico que nos levará quase sempre em lugares comuns?

E, reflito, preocupado: por que não me sinto exultante ao estar próximo de atingir meu objetivo final, enfim, por superar mais este desafio a que me propus?

Na verdade, uma longa caminhada nos transporta, sempre, para uma outra dimensão, o que nos possibilita um autoconhecimento. 

Vivemos todos aqueles dias da forma mais simples possível, despojados de bens materiais e de conforto. 

No entanto, é sempre a ocasião em que mais próximos estamos de Deus e de nós mesmos. 

Livres e felizes! 

Certamente, a expectativa do final da caminhada, começava a esvaziar essa bem-aventurança, devolvendo-me ao mundo agitado e desconfortável das metrópoles. 

Felizmente, me consolava, nenhum “caminho” tem fim, porquanto, cada dia é como um novo passo, a subir e descer pelas trilhas da vida, rumo ao cimo da montanha, onde o Pai faz morada. 

O clima fresco e úmido me ajudou, de forma que uma hora depois e sem atropelos, aportava ao distrito de Camargos, pequeníssima aldeia, com apenas 40 casas, que conservam ainda as características de povoações coloniais do século 18.

Segundo a história, o arraial foi fundado pelos irmãos Tomáz Lopes de Camargos, João Lopes de Camargos e Fernando Lopes de Camargos, em 1.701, quando encontraram um ribeirão aurífero. 

 Devido ao interesse econômico despertado, se estabeleceram no local, originando-se, assim, o povoado de Camargos.

Ali pude apreciar a igreja dedicada à Nossa Senhora da Conceição, uma construção datada da primeira metade do século XVIII, com torres baixas, frontão triangular simples, porta larga e ornamentada com uma bela escadaria de acesso.

Defronte, sobressai singelo e místico cruzeiro talhado em pedra-sabão, único conhecido em Minas Gerais, um dos símbolos mais expressivos de todo o Caminho.

Outra atração singular desse místico lugar, são as ruínas da Fazenda do Tesoureiro, com marcas de pelourinho.  

Após algumas fotos, segui em frente e acessei larga estrada de terra, a partir de pequena ponte, em lenta, mas contínua ascensão, que se prolongou por doze quilômetros, sempre ladeado por densa mata circundante, quase sempre, formada por árvores frondosas.

Segundo os entendidos, esse percurso é bastante vocacionado para caminhadas, cavalgadas, bikes e automotores, pois todo o caminho é feito no dorso de uma estrada em cascalho, muito bem compactada.

Trata-se, na verdade, de uma rota superposta à estrada original, cujo trajeto segue o mesmo das tropas, no passado. 

Por isso, desloca-se naturalmente em curvas de nível, ao modo dos tropeiros e, dessa forma, é possível nela transitar sem grandes desgastes de altimetria.

Assim, durante um bom tempo andei pelo topo das montanhas, com ampla visão ao derredor. 

Finalmente, no vigésimo quilômetro, principiei a descer, primeiramente, de maneira lenta, depois, de forma brusca e perigosa.

Do alto de uma elevação, próxima da Mina Del Rey, avistei o distrito de Pinheiros. 

Já no plano, no vigésimo-segundo quilômetro, comecei a caminhar em piso asfáltico e já avistava o derradeiro marco da Estrada Real. 

Nesse trecho, fui alcançado pela Sandra, que dirigia sua possante picape.

O intenso tráfego, aliado ao enervante barulho de uma cidade com 50 mil habitantes, já tendia a me importunar, de modo que, pela primeira vez em meu périplo, aceitei a carona que me era oferecida.

A camioneta seguiu a 60 quilômetros por hora, muito devagar, considerando a velocidade que ela poderia, facilmente, desenvolver. 

Mesmo assim, seu deslocamento me assustou, porquanto, depois de caminhar, a pé, por quase quinze dias, em um cenário lento e agradável, onde o passo a passo não se confunde com a celeridade de 4 rodas.

Mudar, intempestivamente, de 6 para 60 quilômetros por hora, me causou uma estranha sensação de náusea e tontura. 

Porém, em pouco tempo atravessamos a urbe, e logo ela me deixava na parte velha da cidade, local havia os monumentos históricos mais famosos.

Fundada em 1.711, Mariana foi a primeira capital das capitanias de Minas e São Paulo, título que perdeu, em 1740, para Ouro Preto. 

A cidade apresenta um acervo riquíssimo das mais belas obras do barroco mineiro, presente em suas igrejas e conjuntos arquitetônicos, com acentuada ascendência do artista Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho. 

Parei para fotos no local onde estão situados o antigo prédio da Casa de Câmara e Cadeia, a Capela de Sant'Ana e a Igreja de N. Sra. do Rosário.

Depois, de uma pausa para fotos, lanche e água, prossegui em frente, desta vez, o tempo todo por asfalto.

Ainda, por uma rodovia sem acostamento e com alto grau de aclividade, caminhei todo o percurso, sempre em contínua ascensão.  

No trajeto, transitei em frente à entrada da “Mina da Passagem”, no quarto quilômetro, onde se encontra a belíssima Igreja de Nossa Senhora da Glória. 

Infelizmente, face a pressa em chegar, até porque o sol se mostrava abrasador, optei por visitá-las numa oportunidade próxima, quando retornar às Gerais.

Contudo, ainda que um tanto pesaroso, finalmente, às 11 h 20 h, adentrei à riquíssima Ouro Preto, cidade fundada em 1.698, pelo bandeirante Antônio Dias.

É interessante o efeito que um roteiro dessa magnitude exerce sobre aquele que o percorre. 

Ao avaliar esta parte final, percebo, mais uma vez, que não havia alegria ao sentir que o Caminho estava em seus metros finais, mas, uma sensação de vazio invadiu meu espírito e não pude deixar de pensar no retorno e na frieza do cotidiano na cidade grande.

Primeiro, uma angústia tomou conta de meu ser, depois, sobreveio o desejo de que o roteiro não terminasse. 

E, ao aportar à Praça Tiradentes, mais exatamente, defronte ao Museu da Inconfidência, emocionado, fiz uma prece de agradecimento a Deus, e dei por encerrada minha aventura.

Rapidamente, me alojei no Boroni Palace Hotel. 

E, após gratificante banho, subi até o terminal rodoviário para comprar minha passagem de retorno. 

Depois, mais sereno e descontraído, fui almoçar.

Mais à tarde, percorri os principais pontos turísticos da cidade, como a Matriz de Nossa Senhora do Pilar, a igreja de São Francisco de Paula, o Museu da Inconfidência e a Casa dos Contos. 

E, no dia seguinte, embarquei num ônibus e regressei ao meu lar.

 Contudo, tenho planos de um dia retornar à essa cidade, com o intuito de prosseguir minha jornada até Parati/RJ. 

AVALIAÇÃO PESSOAL – Uma jornada fácil, agradável e bastante arborizada, culminando em uma grande declividade, até atingir a belíssima cidade de Mariana. Quanto à última parte do percurso, especificamente, até Ouro Preto, infelizmente, trata-se de um trajeto sufocante, barulhento e perigoso, sem contar o piso asfáltico a ser vencido e o expressivo número de veículos que trafega nesse trecho. 

Conclusões Finais