11º dia: SANTA BÁRBARA a CATAS ALTAS – 21 quilômetros

 A jornada seria a mais curta de todas, porém, como o sol costumava crestar com muita intensidade, resolvi partir no horário de costume.

E como a padaria situada no andar térreo do hotel onde me hospedei abria suas portas às 5 h, pude descer e fazer ali meu reforçado café da manhã, com bastante tranquilidade. 

Depois, bem disposto, iniciei minha aventura, às 5 h 40 min.

O percurso previsto em minhas anotações, mostrava que eu deveria acessar uma estradinha de terra, à direita, logo após deixar a zona urbana. 

Ocorre que, ao conversar com alguns moradores e taxistas locais no dia anterior, fui dissuadido de tal ideia, pois, disseram-me que a trilha fora desativada, há tempos, desde que um sitiante havia obstruído, com porteiras e cadeados, a passagem nesse trecho.

 Por segurança, e como não tinha condições de confirmar tais assertivas, resolvi seguir as novas orientações. 

Assim, deixei o hotel, passei ao lado da igreja do Rosário, desci a rua onde se localiza o Hotel Quadrado e caminhei em direção a um trevo, ainda no perímetro urbano da cidade.

A partir dele, pude acessar a rodovia MG-129, e segui em direção à Catas Altas, caminhando 6 quilômetros em asfalto, no sentido contrário ao fluxo de veículos.

Foi um percurso duríssimo e sob forte tensão, pois, nesse trecho não há acostamento e o trânsito, àquela hora, era intenso, composto, quase sempre, por veículos pesados, como ônibus e caminhões. 

Em alguns locais, a distância que me separava desses monstros, sempre em alta velocidade, era de apenas alguns centímetros. 

Um verdadeiro sufoco.

 Finalmente, após uma hora sob grande risco e desgastante inquietação, entrei à direita, numa estrada cascalhada, em direção à mineradora Pedreira 1. 

Assim, depois de passar por ela, segui numa larga e agradável estrada de terra, com pouquíssimo tráfego.

 Logo adentrei em agradável bosque de eucaliptos e, mais à frente, encontrei, destacando-se na paisagem, o famoso “Bicame de Pedras”, um imponente e audacioso projeto de engenharia do século XVIII.

Construído em quartzito da formação Moeda, sua finalidade era levar água do córrego Quebra-Ossos, desde sua nascente, às fazendas e minerações existentes na região.

Atualmente, existem cerca de 150 metros desse monumento, que tem, ao centro, um portal com a inscrição de construção - 1.792. 

Incrustada, em sua lateral, há uma escadaria de pedras que dá acesso à parte superior do aqueduto. 

Ao seu redor e entre as pedras, existe vegetação rasteira. 

Segundo relatos da época, esta obra originalmente se estendia por 18 quilômetros.

 Após uma pausa para fotos e breve visita ao monumento, prossegui adiante e, logo à frente, emocionado, avistei ainda um tanto imersa nas nuvens, a impressionante e belíssima serra do Caraça.

Na sequência, transpus a porteira da Fazenda Ouro Verde, atravessei um túnel debaixo da ferrovia, fiz um giro de 90º e, subindo à esquerda, passei a caminhar ao lado da via férrea, tendo-a do meu lado direito.

Um quilômetro depois, entrei à esquerda e segui por uma estrada  cascalhada, barrenta e extremamente escorregadia, sempre em meio a densa vegetação lateral. 

Calmamente, fui progredindo e apreciando a maravilhosa paisagem circundante.

E, uma hora depois, avistava Catas Altas, minha meta para aquele dia.

Mais um quilômetro morro abaixo, entrei no perímetro urbano e prossegui em uma via calçada por pedras pontiagudas e irregulares, até alcançar a belíssima Pousada Solar da Serra, local onde fiquei hospedado.

A cidade foi fundada em 1.702, por Domingos Borges e Manuel Dias, que desbravaram a região e descobriram na parte oriental da Serra do Caraça, jazidas de ouro, que eram denominadas de Catas Altas. 

Esse nome era atribuído à profundeza das escavações que os exploradores tinham que enfrentar. 

O município abriga ainda o Santuário do Caraça, que foi fundado em 1820 pelo Irmão Lourenço. 

Ali existiu um famoso colégio destruído por um incêndio em 1968. 

As ruínas foram transformadas em museu e biblioteca, com exemplares de 1.700.

Atualmente, Caraça é uma Reserva Particular do Patrimônio Natural, que preserva além das serras e de impressionantes cachoeiras, também, exemplares da fauna e da flora brasileira, como o lobo-guará, que hoje está ameaçado de extinção.

Para almoçar, utilizei os estupendos serviços do restaurante Taipa. 

Depois, fui à internet dar notícias, aproveitando, ainda, para conhecer o Museu do Vinho.

Após breve descanso, saí para conhecer a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição, localizada na praça principal da urbe, um dos mais importantes templos mineiros, pois, guarda o documento de celebração do primeiro batismo na capela, datado de 1712. 

Além disso, possui, em seu interior, obras de Aleijadinho.

 A edificação feita em madeira de taipa e pedra, possui duas torres sineiras bulbáceas, que representam a influência da arquitetura mourisca, correspondendo ao tipo tradicional das matrizes mineiras. 

Como referenciais, existe na fachada um óculo cruciforme, três portas externas almofadadas e, sobre cada uma delas, há uma janela envidraçada.

Era quarta-feira, e naquele final de semana seria realizada na cidade a tradicional Festa do Vinho, já em sua 9ª edição. 

Vale lembrar que o vinho comercializado e servido, é extraído do fruto da jabuticabeira.

Assim, por conta dos festejos, a praça principal foi interditada para trânsito de veículos e uma grande balbúrdia se instalou, em face da montagem das barracas e de um grande palco, onde se apresentariam os músicos e cantores.

Alheio à toda essa movimentação, eu apreciava a beleza do local, em todos os seus detalhes. 

Na verdade, aquela foi a cidade em que melhor me senti durante minha aventura, vez que transpirava um alto astral contagiante.

A visão da serra da Caraça, há apenas alguns quilômetros de distância, foi simplesmente, deslumbrante, e fazia com que eu não me cansasse de admirar essa impressionante e grandiosa obra da natureza.

Ao retornar no local de pernoite, passei diante do “Bar da Ora”, um local temático, onde me deparei com uma estátua, em tamanho natural, de Raul Seixas, à porta. 

Não resisti e entrei, pois no interior do ambiente, em alto e bom som, antigos sucessos desse polêmico cantor eram audíveis.

 Ali conheci o Zé Maria, dono daquele atelier e escultor de trabalhos em madeira, e, como eu, fã incondicional do “Maluco Beleza”. 

Assim, ao lado de outra maquete do Raulzito, aproveitamos o ensejo e fizemos uma alegre e irreparável foto, em conjunto, para a posteridade.

Da janela do quarto onde me hospedei, tinha uma visão frontal incrível e privilegiada de todo o conjunto montanhoso e passei momentos inesquecíveis a admirá-lo.

O sol se punha lentamente no ocaso e, já sendo encoberto pelas sombras, avistava, primeiramente, à direita, a serra do Quebra-Ossos. 

Mais ao meio, o robusto Pico de Catas Altas, com 1.810 m de altitude.

Em sequência, à esquerda, o maciço da Caraça, cujos contornos lembram a face de um índio deitado, em todos os detalhes. 

Mais ao fundo, o Pico do Sol, com 2.010 m e, por trás deste, quase imperceptível, o Pico do Baiano, o maior de todos, com 2.086 metros de altura.

Sem dúvida, conhecer e pernoitar em Catas Altas me foi uma grata surpresa, já que essa cidadezinha me encantou por sua originalidade e limpeza. 

Com certeza, é um lugar mágico, místico e repleto de energias positivas, que emanam da exuberante natureza em que está mergulhado.  

IMPRESSÃO PESSOALO mais curto percurso trilhado em todo o Caminho, mostrou-se maravilhoso, não só pelo encontro com o Bicame de Pedra, mas, principalmente, pela impressionante visão da serra do Caraça, juntamente com a alegria de conhecer a cidade de Catas Altas. No geral, uma jornada bonita e fácil. A lamentar, contudo, os sete primeiros quilômetros, feitos sobre asfalto, numa rodovia movimentada, perigosa e sem acostamento.

12º dia: CATAS ALTAS a BENTO RODRIGUES: 29 quilômetros