5 - CAMPOS DO JORDÃO a PINDAMONHANGABA

5 - CAMPOS DO JORDÃO à PINDAMONHANGABA - 47 quilômetros

                O clima me favorecera nas jornadas pretéritas, quando encontrara quase sempre o tempo nublado.

             No entanto, a previsão metereológica para aquela data indicava sol forte e muito calor, de forma que às 4 h 30 min eu já estava em pé, me preparando para a longa jornada do dia.

            Depois de ingerir um copo de café preto que gentilmente o funcionário noturno da Pousada me preparou, degluti uma banana e, exatamente, às 5 h 15 min, quando ainda estava escuro, eu deixei o local de pernoite e segui, à direita, pela Avenida Januário Miráglia.

           Fazia bastante frio e um termômetro instalado numa praça por onde, em seguida, transitei marcava 12 graus, e um vento gelado varria todo o ambiente, forçando-me a erguer a gola do casaco, como prevenção contra um possível resfriado.

             Logo abaixo, afixada num poste, uma placa indicativa do Caminho da Fé me avisava que restavam 72 quilômetros para atingir meu objetivo final.

             Depois de quase três quilômetros caminhados sempre no plano, atravessei defronte à estação Francalanza e, em seguida, girei à esquerda, seguindo pela estrada Ernesto Diederichsen.

            Nesse trecho, encontrei muitas pessoas já se dirigindo ao labor diário, a maior parte de bicicleta e motocicleta, porém algumas a pé, com as quais pude trocar uma saudação e, quando tinha dúvida, indagar se estava no rumo certo, pois o dia ainda não havia clareado de todo.

            Depois de cinco quilômetros, acabou-se o asfalto e passei a caminhar em terra, agora já em pequena ascendência e, logo à frente passei defronte do Centro de Lazer Tarundu, um amplo espaço de recreação, todo cercado por grossas malhas de tela.

             Já no topo de pequeno outeiro eu girei à direita, atravessei a linha do trem, e passei a caminhar definitivamente por asfalto, em direção ao Hotel Toriba.

   E logo em seguida transitei pelo Alto do Lageado, onde está instalada a famosa estação Cacique, o ponto culminante ferroviário do Brasil, localizado a 1.743 m de altitude.

             Na sequência, caminhando entre um bosque de coníferas, pude avistar, à minha direita, ao longe, uma grande conformação rochosa e nela, em destaque, a inconfundível Pedra do Baú.

             Depois de nove quilômetros percorridos, finalmente aportei ao Mirante do Lajeado, que está a 1.780 m de altura, local de maior altimetria em que eu transitaria nessa etapa.

          A vista que dali se descortinava era efetivamente maravilhosa, posto que eu tinha uma ampla visão de todo o vale do Paraíba, podendo, em face do tempo claro, inclusive, identificar cinco ou seis cidades no horizonte, tais como Taubaté e São José dos Campos.         

             Fiz ali uma pausa para hidratação e fotos, porquanto o clima persistia fresco e agradável, embora o sol já houvesse aparecido com força total, o que me fazia antever calor infernal, após as 10 horas.

             Se eu pudesse ficaria ali por muito mais tempo, aproveitando o clima acolhedor e o lindo cenário, mas era hora de prosseguir adiante.

             A partir daquele ponto iniciou-se um brusco descenso, que fui vencendo com bastante cuidado, pois embora o piso fosse asfáltico, em alguns locais se encontrava bastante erodido, úmido e liso.

              Depois de 11 quilômetros caminhados, às 7 h 30 min, eu reencontrei novamente a ferrovia.

              Então, obedecendo à sinalização do roteiro, entrei à esquerda e passei a caminhar pelo leito férreo.

   Embora estive sempre em meio a muito verde, o trajeto prosseguiu lento e desajeitado, vez que os dormentes não estão assentados com espassamento constante, quebrando o bom ritmo de minha solitária caminhada.

            Assim, fui alternando meus passos, pois em alguns locais era possível seguir à beira da ferrovia, embora fosse num espaço bastante diminuto e com piso extremamente irregular, o que me obrigava a transitar com muito cuidado.

        Nessa sofrida toada, porém sem fazer pausas, ultrapassei primeiramente a estação de Renápolis, situada a 1.317 metros de altitude e distante 31.230 metros de Pindamonhangaba.

             Mais abaixo, passei pela Estação Pagé, um local que se encontra totalmente abandonado, embora existam algumas residências nas imediações, um conforto, isto porque me possibilitaria conseguir água, se estivesse necessitando.

             Finalmente, depois de transpor a rodovia que liga Campos de Jordão a Santo Antonio do Pinhal por um pontilhão e de caminhar 5.500 metros pela linha do trem, às 8 h 30 min, aportei à Estação Eugênio Lefevre.

   O complexo turístico existente no local engloba algumas lojas de artesanato, a famosa lanchonete “Bolinho de Bacalhau e Cia. Ltda.”, bem como existem ali instalações sanitárias decentes.

    Nesse local os turistas podem comprar derivados de mel, plantas, camisetas, postais e conversar com o chefe da estação.

    O edifício da estação foi inaugurado em 1.919, representa uma verdadeira relíquia da história ferroviária do país e funciona até os tempos atuais em seu prédio original.

    Ela está situada a 1.162 m de altitude e é parada obrigatória do trem turístico que sobe de Pindamonhangaba para Campos do Jordão.

            Porém eu já conhecia o local, e como me sentia bem disposto e animado, resolvi seguir adiante.

            Duzentos metros depois, eu adentrei num famoso mirante ali existente, onde está fincada uma grandiosa imagem de Nossa Senhora Auxiliadora, inaugurada em 1.971.

            Pude então externar minhas preces à Mãe Maria, bem como admirar a bela paisagem que dali se descortinava, podendo visualizar no horizonte algumas cidades do vale do Paraíba, dentre elas, Caçapava e Taubaté.

          Na sequência, prossegui ainda pela via férrea por mais uns 300 metros, quando as flechas me direcionaram para a esquerda, em direção à descida pela estrada velha, que antigamente ligava Pindamonhangaba a Campos de Jordão.

            Eu já fizera esse percurso em minha peregrinação de 2.005 e sabia das dificuldades que ele apresenta, como pedras soltas, terreno extremamente inclinado e liso, umidade e intensas voçorocas.

            Além disso, esse trajeto é desaconselhado em dias de chuva e, sabia de antemão, conforme informações colhidas no dia anterior, que aquela região fora palco de grande intempérie naquela semana.

          Ademais, soubera que recentemente um peregrino havia topado com uma grande cobra nesse trecho, de forma que, prudentemente, resolvi prosseguir pelos trilhos.

          Embora fosse uma opção dolorida, pois além do desconforto no andar e o risco de ser atropelado por alguma composição a trafegar nesse leito, tal opção acrescentaria mais dois quilômetros em minha jornada.

             O trecho, por certo, não desce abruptamente, mas alonga bastante o percurso, porque contorna as montanhas que ali existem.

             Em compensação, as paisagens ao derredor são exuberantes, contudo eu não podia prestar muita atenção nelas, por conta do risco de tropeçar nos dormentes.

             Finalmente, depois de extenso declive e mais 30 minutos caminhando, já em terreno plano, reencontrei o roteiro oficial, exatamente, no local em que ele discorre para o outro lado da ferrovia.

            Então, obedecendo à sinalização, prossegui à direita por uma larga estrada de terra, em perene declive, ladeado por extensas pastagens e farta vegetação.

            Finalmente, passei pelo marco dos 50 quilômetros restantes até Aparecida, e logo estava defronte à pousada Serra da Mantiqueira, uma ótima opção para pernoite, contudo minha meta para aquele dia ainda estava longe.

            Assim, prossegui em frente, agora definitivamente por asftalto e, às 10 h, fatigado e sedento, cheguei à Estação Piracuama, um bairro de Pindamonhangaba, que se tornou turístico.

            Ali existem várias pousadas, casas de veraneio e um clube de campo que atendem principalmente famílias vindas da capital paulista.

  O local é banhado pelo rio Piracuama ou “o rio das covas de peixes” na língua indígena, uma corrente líquida composta de águas frias e cristalinas, oriundas da serra da Mantiqueira.

            O sol estava fortíssimo, e diferentemente do refrigério que tivera na serra, parecia que estava adentrando a um forno, tamanho o calor que sentia naquela planura.

            Fiz, então, debaixo de providencial sombra, uma pausa para lanche, hidratação e renovação do protetor solar.

  Depois, mais animado, segui adiante.

           Continuei a caminhar, agora definitivamente por asfalto, e depois de um quilômetro percorrido, acessei a rodovia que vai em direção à Pindamonhangaba, por sinal, bastante movimentada naquele horário e com uma agravante, não possui acostamento.

        Nesse trecho a vegetação ao meu redor mudou completamente, pois as vigorosas matas por onde caminhei no alto da montanha deram lugar a campos de pastagem, com mínima vegetação arbórea.

           Lentamente, fui vencendo as distâncias e depois de mais cinco quilômetros caminhados, passei pelo bar do Rancho Fundo, porém só fiz uma pausa mais à frente, no bar Bonsucesso, onde pude adquirir água, quando ainda me restavam 14 quilômetros para chegar.

            Diante de meus olhos pude ver uma larga planície, limitada no horizonte pela Mantiqueira.

            A estrada, totalmente retilínea, parecia infinita e enquanto eu caminhava ia observando as pastagens e as plantações de arroz que sobejam nesse trecho.

            O silêncio daqueles campos só era quebrado, de quando em vez, pelo canto de algum pássaro ou pelo barulho dos carros que trafegavam pela rodovia.

            Em compensação, o sol se fazia abrasador, obrigando-me a ingerir o precioso líquido com constância.

  Mesmo assim, com grande denodo fui vencendo as distâncias, até que, finalmente, às 13 h, eu atravessei a ponte existente sobre o rio Paraíba do Sul e adentrei em trecho urbano.

          Na sequência, caminhei ainda 5 quilômetros em meio a bairros residenciais, por ruas desprovidas de sombra, até aportar às 14 h, completamente exausto, na pousada Fortaleza, local onde fiquei hospedado.

            Como curiosidade, nesse trecho citatino eu passei defronte ao famoso Bosque da Princesa, cuja origem data o ano de 1.868, quando da visita à cidade dos recém-casados: conde D’Eu e a princesa Isabel Cristina.

           Entre os eventos programados para recepcioná-los, surgiu a ideia de oferecer ao casal um local onde pudessem desfrutar de agradáveis momentos a sós e, para tanto, remodelou-se um bosque que existia junto ao rio.

            Pindamonhangaba é uma cidade com 140 mil habitantes, que mescla o antigo com o moderno.

  No passado, como outras cidades do Vale do Paraíba, foi grande produtora de café e os senhores desse tempo ostentavam títulos imperiais.

  Conta-se que D. Pedro II, quando viajava do Rio para São Paulo, se hospedava no palacete senhorial do Visconde de Palmeiras, onde hoje funciona o museu histórico da cidade.

  Outros destaques são a Igreja Matriz, em louvor a Nossa Senhora do Bonsucesso, o antigo prédio da Prefeitura Municipal, o Quartel do 2º BEC (Exército), e o Mercado Municipal, com os seus azulejos na entrada.

  Conta-se, mais, que muitos oficiais do Batalhão da Guarda do Imperador eram de Pinda, e que seus restos mortais foram enterrados na Igreja de São José.

  A par disso, Pindamonhangaba tem um diversificado parque industrial, destacando-se as Indústrias Villares, bem como um comércio bastante movimentado, com boas lojas, bancos, restaurantes, etc.

 Outro destaque de Pinda é a Estrada de Ferro Campos do Jordão, que atende o centro e vários de seus bairros, proporcionando transporte mais barato que o ônibus, além de se constituir num belo itinerário turístico.

  Isso sem esquecer que é a cidade natal do atual governador Geraldo Alckmin, cujo nascimento deu-se em 06/11/1952.

           Depois de reconfortamente banho, seguido de uma vigorosa massagem em meus pés, onde utilizei um conceituado creme analgésico, desci para almoçar no bar existente no piso térreo do local onde pernoitaria.

         Ali mantive alegre contato com o Sr. Clóvis, um veterano caminhante residente em Mongaguá, cuja experiência peregrina engloba, dentre outras façanhas, 4 vezes o Caminho da Fé e 5 vezes o de Santiago.

            Mais tarde, após um bom e reparador sono, fui até uma “lan-house” próxima, para postar notícias aos meus familiares.

           Quando retornava, me encontrei com o pessoal pertencente ao grupo de Descalvado que chegava à pensão naquele horário, todos extremamente cansados, porém com intensa alegria estampada no rosto pelo feito realizado.

            Foi um reencontro alegre e que rendeu uma gostosa confraternização mais tarde, feita no bar localizado ao lado da pousada, já que ambos pertencem ao mesmo proprietário.

          Sobre o meu local de pernoite, em termos estruturais, necessário uma análise fria e baseada em minha larga experiência de caminhante, porquanto ela é totalmente inadequada para receber os peregrinos do Caminho da Fé.

 Diria até que mesmo para romeiros, que quase sempre portam pouca bagagem e são assistidos por veículos de apoio, porquanto seus quartos são mal iluminados, não possuem ventilação e suas dimensões são ínfimas para abrigar dois beliches.

            Em minha opinião, ali caberia, no máximo 2 pessoas, e ainda apertadas, para dividir o mísero espaço disponível, mas, infelizmente não é dessa forma que ocorre.

            Acrescente-se a isso o fato de receber pouca luz do sol, os dormitórios exalam forte cheiro de mofo, um tormento para pessoas que padecem de rinite alérgica, como no meu caso.

            Fica aqui uma sugestão de cunho pessoal para os Diretores do Caminho da Fé: A jornada após a cidade de Campos do Jordão perde todo o encanto, em face do trajeto pela linha do trem, depois, pelo piso asfáltico que se enfrenta até Aparecida.

            Tudo isto acrescido ao risco de atropelamento e assaltos, além de se ter que caminhar por uma paisagem urbana, diferentemente do que se vivencia nas jornadas pretéritas.

            Uma proposta seria abrir uma variante já muito utilizada por romeiros provindos do Estado de Minas Gerais, qual seja, a partir de Campos de Jordão, seguir em direção a Pedrinhas, um distrito de Guaratinguetá.

            E depois, à Aparecida, posto que esse roteiro é feito todo por zona rural, com o bucolismo das paisagens e isento das mazelas que as grandes cidades proporcionam.

 6 - PINDAMONHANGABA à APARECIDA