Sexta Etapa: ANDRADAS (MG) a CRISÓLIA (OURO FINO-MG) – 36 quilômetros

Passeando em Crisólia/MG

Mega-escultura do Menino da Porteira em Ouro Fino/MG

O vaticínio televisivo afirmava que o dia seria reluzente e diáfano. 

Por conta disso, parti às 5 h, sem tomar o café da manhã, objetivando atenuar o lapso de tempo que seria forçado a caminhar sob o sol a pino.

Passei, primeiramente, em frente à rodoviária da cidade. 

Ali, virei à esquerda, e caminhei um bom tempo por ruas pavimentadas até alcançar um posto de gasolina, na saída para Ouro Fino.

A partir dali, prossegui uns 500 metros, por asfalto, até adentrar à direita, numa larga e movimentada via vicinal de terra, já cognominada pelos peregrinos de “Estrada dos Fuscas”, tamanha a quantidade desse tipo de veículo a circular naquelas paragens.

O Caminho segue, então, entre belas propriedades campestres, dedicadas a criação de gado leiteiro, contudo, depois da Adega de Vinhos Campinho, e da Chácara Santa Clara, onde se localiza a Vinícola e Engarrafadora de Vinhos Belotto, a paisagem muda radicalmente.

Dali caminhei cortando enormes fazendas de café e, após duas horas, sempre por uma estrada larga e em leve ascensão, cheguei às franjas da temível Serra dos Lima.

Iniciei, então, uma subida íngreme e brusca. A escalada é lenta e árdua, pois a encosta é terrivelmente alcantilada. 

Após, atravessar a Fazenda Roda D’água, atinge-se o cume, a 1.221 m de altitude.  Entretanto, o esforço empregado é compensatório, posto que a visão ampla de quem está no topo do morro, é simplesmente espetacular.

Enquanto fazia uma pausa para descanso, um som peculiar atraiu minha atenção. 

Numa bananeira próxima, avistei vários tucanos, calmamente, devorando sua refeição matinal.

Essa ave, bastante encontrada na região, segundo um morador local, possui hábitos gregários, ou seja, vive ordinariamente em bando, e seu alimento predileto são as frutas. 

Ali, juntos, dividindo “o pão”, contei mais de 10 pássaros, fascinado por aquela visão rara e inesperada, num espetáculo surpreendente e multicolorido.

Foi agradabilíssimo caminhar no alto da serra, pois, além da paisagem verdejante e paradisíaca ali existentes, o clima é ameno e fresco. Em breve, adentrei à pequena povoação, após já ter vencido 15 quilômetros de jornada.

A localidade pertence ao Município de Andradas, possui igreja, escola e bar, e tem na cultura cafeeira a sua principal atividade econômica.

Exatamente, às 8 h 30 min, bati palmas em frente à casa do Márcio e da Cárita, os representantes do Caminho da Fé naquele local, para carimbar minha credencial. 

Fui muito bem recebido por ambos, que juntamente com sua filhinha Isadora, de 3 anos, formam uma bonita e simpática família.

Conversamos um pouco, serviram-me café e bolo, e contaram-me, resumidamente, um pouco da experiência que tiveram em acolher peregrinos.

Um dos grandes problemas naquele local, conforme me confessaram, resume-se em acomodar pessoas, já que o pouso ali, se necessário, ainda é bastante desconfortável, ficando os hóspedes alojados em local precário e improvisado, numa escola municipal.

Depois das despedidas, segui em frente por uma estrada plana e levemente ascendente, e logo depois avistei ao longe, no sopé da serra, uma pequena povoação, que fui deixando à direita, denominada São José do Mato Dentro.

Pude contemplar, também, à minha frente, no horizonte, um pequeno aglomerado de casas num vale, uma minúscula vila, exatamente aquela que seria o meu próximo destino. 

A partir dali, iniciou-se terrível e constante descenso, sempre em meio a belas fazendas de gado e café.

Às 10 h, mais 8 quilômetros percorridos, cheguei à pequena São Pedro da Barra, mais conhecida por Barra, um povoado simples e hospitaleiro, cuja vila situa-se parte no município de Andradas e parte em Ouro Fino, encravada a 922 m de altitude e, curiosamente, fazendo divisa, também, num pequeno vértice, com o município de Jacutinga. 

Possui atualmente 250 habitantes, e tem na cultura cafeeira sua principal atividade econômica.

Aí, recentemente, foi inaugurada uma moderna e acolhedora Pousada, cuja proprietária, Dona Joelma, tinha a incumbência de carimbar as credenciais. 

Muito simpática e receptiva, deu-me várias informações, além de prover-me água.

Contou-me que seu marido, Sr. João Batista, fizera recentemente o Caminho da Fé, partindo de Tambaú, concluindo-o, em 12 dias. 

Também pudera, disse, ante minha admiração: “A vida dele é diariamente subir e descer morros, capinando e colhendo café, quer melhor preparação física que essa? - complementou sorrindo”.

Após calorosas despedidas, segui adiante, pois o sol já molestava inclemente. 

À saída, encontrei forte e inclinada elevação, numa ascensão brusca que se prolongou por um bom trecho. É o famoso Morro do Calisto de Oliveira.

Depois, o Caminho prossegue em meio a locais bucólicos e singelos, com pequenas subidas e descidas, cortando-se inúmeras fazendas de café e de criação de gado. 

Às 12 h ultrapassei o pequeno povoado de Taguá e, finalmente, às 14 h adentrava Crisólia, distrito de Ouro Fino, distante sete quilômetros de sua sede.

Esse pequeno povoado nasceu por se ter encontrado uma pequena imagem de Nossa Senhora da Piedade, primeiro nome dado ao vilarejo, que posteriormente passou a se chamar Paróquia de N. Sra. da Piedade.

Construído o primeiro oratório vieram as primeiras graças e, em razão desses milagres, o número de devotos não parou de crescer. 

Foi construída, então, a atual capela e o distrito atualmente denomina-se Crisólia, contando com 5.235 habitantes.

O jogador Evair, que já atuou em inúmeros clubes de futebol no Brasil e do exterior, inclusive na seleção “canarinha”, é natural daquela localidade, e sua mãe ainda lá reside, motivo de orgulho para os moradores locais, que fazem questão de apontar sua casa para que os visitantes a admirem.

Em Crisólia tive a credencial carimbada e fiz minhas refeições, num bar de propriedade da Zétti, senhora risonha e franca. Ela é uma das pessoas mais famosas e respeitadas no Caminho da Fé, pela forma alegre e atenciosa com que trata a todos.

Compulsando seu “Livro de Visitas”, pude aquilatar nas mensagens grafadas pelos peregrinos, os agradecimentos sinceros ali deixados transcritos, ao se sentirem dignificados com a acolhedora recepção a eles dispensada.

À tardezinha fui visitar a igreja matriz do povoado, que se encontrava em reformas. 

O Sr. Lázaro, que por sinal é irmão da Zétti, administrava, graciosamente, a empreitada. Com extrema solicitude mostrou-se a obra em andamento, enfatizando que tudo ali estava sendo executado em sistema de mutirão, com a ajuda da comunidade paroquiana.

Na saída me apresentou o pároco local, Padre Antonio, pessoa simples e humilde, de excelente humor, palmeirense roxo, e com muita experiência de vida, vez que se ordenou com mais de 45 anos de idade.

Num bar, em frente à praça central, fiz amizade com o Sr. Benedito, uma pessoa deveras instigante. Ele nasceu e ali reside, há mais de 60 anos.

Contou-me inúmeras histórias sobre os hábitos das pessoas naquele local e, face minha curiosidade pelo assunto, explicou-me que a paixão dos moradores daquela região pelo “fusca”, deve-se ao fato do “itamarzinho” ser um carro barato, de fácil manejo, mecânica simples e com tração dianteira, um diferencial expressivo para sobrepujar as confragosas serras mineiras. 

A ratificar, com propriedade, a “superabundância” desse tipo de sedan que encontrei durante minha jornada.

Para dormir, fiquei alojado na casa de Dona Adelaide e do Sr. Mário, pessoas na faixa etária dos 70 anos, pais de 7 filhos já casados, que disponibilizam 2 quartos e 8 camas aos visitantes, por módico preço.

A residência é bastante simples e antiga, além do que, existe apenas um banheiro que serve a moradia toda, e está localizado no lado externo da construção. 

Mas, a preocupação em agradar e acolher bem aos que ali se hospedam, emociona e compensa, a rusticidade do local, pois, ali fui tratado como se fosse um filho do casal.

AVALIAÇÃO PESSOAL:

Uma etapa, também, de razoável dificuldade, a começar pela distância percorrida. Depois, a Serra dos Lima, realmente é um obstáculo nada fácil de superar, bem como a forte descida até a Barra, que magoa sensivelmente nossos pés e joelhos, pela impetuosa descensão que se enfrenta nos quilômetros derradeiros.