2021 – CAMINHO DE GRAÇAS & PROSAS - 127 QUILÔMETROS


Cada um de nós tem um peregrino em si e uma pegada a ser deixada para que outro saiba por onde passar e conhecer a sua história.

Eu tomei conhecimento da existência desse novel roteiro, recentemente, e encantado com a possibilidade de caminhar novamente em terras mineiras, adquiri passagens, desci do ônibus na cidade de Ouro Fino e de lá prossegui em frente!


APRESENTAÇÃO DESSE CAMINHO


"Se você não se desafiar não saberá o quão longe poderá chegar.


O Caminho de Graças & Prosas é um projeto idealizado em 2016 pelo Engenheiro Ambiental Rony Corrêa. É uma iniciativa sem vínculos político-partidários. Ao todo, o caminho possui cerca de 113 quilômetros de distância, conectando os municípios mineiros de Inconfidentes, Bueno Brandão, Bom Repouso, Tocos do Moji, Borda da Mata e Ouro fino, em uma rota circular. O caminho tem como principais objetivos:


- incentivar a prática de caminhadas de longo curso,


- informar e dar suporte inicial aos peregrinos, ciclistas e turistas,


- apoiar e divulgar o turismo gastronômico e culturas locais nos municípios envolvidos,


- incentivar o empreendedorismo de artesãos e produtores rurais,


- fomentar a agricultura familiar,


- preservar e recuperar áreas que compõem o trajeto,


- e conectar pessoas, ideias e localidades.


A Associação Caminhos de Graças e Prosas é responsável pela gestão do Caminho. É uma associação sem fins econômicos, de direito privado, com autonomia administrativa e financeira.


O nome do Caminho é polissêmico, apesentando vários significados. Faz alusão à Nossa Senhora das Graças de Bom Repouso, MG, e ao ato de peregrinar. É um Caminho de muitas graças, com um dedinho de prosa.


Fonte: bit.ly/caminhogp

1º dia: OURO FINO/MG a INCONFIDENTES/MG – 10 QUILÔMETROS


Senhor, não por eu merecer... Mas por sua graça, seu amor e sua misericórdia... Acampa seus anjos da guarda ao meu redor!


Eu apeei do ônibus em Ouro Fino, fui até os sanitários, me paramentei para a curtíssima jornada que encetaria, depois, segui por ruas movimentadas em direção à igreja matriz da cidade, cujos padroeiros são Nossa Senhora de Fátima e São Francisco de Paula.


Fazia um calor mediano e o sol brilhava num céu azul e, praticamente, sem nuvens, assim, sem maiores novidades, transitei pela praça central da cidade, depois principiei a descer por uma rua calçada por paralelepípedos e após dois quilômetros percorridos, o asfalto findou e iniciou-se uma agradável estrada de terra.


Esse primeiro trecho corresponde à antiga “Estrada Velha”, denominada de “Estrada dos Santos Negros” por decreto municipal, e sua inauguração ocorreu em 13 de maio de 2.009.


Tal percurso é extremamente agradável, por ser todo arborizado, e propiciar vistas preciosas da paisagem circundante.


Uma longa e prazerosa ascensão me levou até o topo de um morro, enquanto lentamente minha musculatura se aquecia e, a partir dali o caminho bastante largo conduziu-me, em suave descenso, em meio a bosques de eucaliptos e outras árvores, rodeado por bucólicos cenários de belezas indescritíveis, enquanto a manhã se mostrava maravilhosa, hidratada e fresca.


Cinco quilômetros percorridos e eu passei pela divisa dos municípios e às 12 h, após transpor a ponte sobre o rio Moji-Guaçu, cheguei à cidade de Inconfidentes.


Depois de fotografar o “Monumento ao Peregrino”, existente na entrada da cidade, eu parei no bar do Maurão para matar saudades, local onde retornei à tardezinha para rever o amigo Eraldo José Sarapu, o fundador e responsável pelo Caminho de Nhá Chica, que eu percorrera há dois anos.


Algumas fotos desse dia:

Imorredouras paisagens mineiras, próximo de Inconfidentes/MG.

Capelinha de São Judas Tadeu, localizada na entrada de Inconfidentes/MG.

"Monumento ao Peregrino", em Inconfidentes/MG.

Com meus grandes amigos: Maurão e Eraldo José Sarapu, no bar do Maurão, local imperdível em Inconfidentes/MG.

Inconfidentes possuiu uma população estimada para o ano 2020 de 7.358 habitantes e seu nome é uma homenagem aos participantes da Inconfidência Mineira. Seus primeiros colonizadores foram os bandeirantes, que vieram em busca de ouro na região. O ourofinense e presidente do Estado de Minas Gerais, Júlio Bueno Brandão tomou as providências para aquisição de terreno para a criação de uma Colônia Agrícola de Estrangeiros, onde é o atual município, em 22 de maio de 1910. Ao todo, foram divididos 205 lotes entre italianos, espanhóis, portugueses, russos, estonianos, franceses, suíços, dentre outros. A colônia foi denominada como Núcleo Colonial Inconfidentes. Em 1920 a função agrícola do núcleo foi reforçada com a transferência do Patronato Agrícola Visconde de Mauá, do Rio de Janeiro para Inconfidentes (IBGE, 2021). O município é conhecido, nacionalmente, pela produção e comercialização de crochê. A cidade sedia, ainda, um Campus do Instituto Federal do Sul de Minas Gerais, ofertando diversos cursos de nível técnico e superior, com destaque para as áreas de ciências agrárias. O município também é integrante do Caminho da Fé, famosa rota brasileira que leva ao Santuário Nacional de Aparecida. (Fonte: bit.ly/caminhogp)


RESUMO DO DIA: Clima: frio e ensolarado, com temperatura variando entre 13 e 20 graus.


Pernoite na Pousada Martinelli: Apartamento individual excelente – Preço: R$65,00


Almoço no Restaurante Martinelli: Excelente! – Preço: R$39,90, o quilo no sistema Self-Service.


AVALIAÇÃO PESSOAL - Uma etapa de diminuta extensão e já minha velha conhecida, que percorri, apenas, para aquecer meus músculos. No entanto, trata-se de um percurso de esplendorosa beleza, onde aproveitei para me reconectar com a natureza, já prelibando a etapa que inauguraria na manhã sequente.


2º dia: INCONFIDENTES/MG a BUENO BRANDÃO/MG – 27 QUILÔMETROS


Todo pensamento positivo te impulsiona na direção certa!


A jornada seria de razoável extensão e a chuva prevista para aquela data chegou de madrugada e com grande intensidade.


Nessa etapa eu teria a grata companhia do meu “Xará” Oswaldinho e do Sérgio, porém quando eles chegaram no local onde eu estava hospedado, por volta das 5 h 40 min, ainda chovia forte, assim, aguardamos a intempérie amainar, antes de partir.


Então, percorremos 600 m pelo acostamento da rodovia MG-290, depois, adentramos à esquerda em larga estrada de terra, extremamente lisa, face ao recente aguaceiro.


O caminho entremeou aclives e acensos leves, sempre ladeados por extensas pastagens e plantações de café, a tônica nesse trajeto inicial, por sinal, de “encher os olhos”.


Infelizmente, as pancadas d’água se sucediam amiúde, obrigando-nos a colocar para depois desvestir nossa capa protetora, enquanto seguíamos firmes em frente, conversando animadamente e, de quando em vez, uma sonora gargalhada explodia na trilha.


Nesse pique, passamos diante da igreja de São Judas Tadeu, no bairro da Grama, depois, transitamos próximo da Cachoeira Dois Pulos e caminhando por estradas rurais lisas e, em alguns locais, com imensas poças d’água, no 13º quilômetro nós fizemos uma parada no bairro Boa Vista dos Góes, para fotografar e visitar a Capela de Nossa Senhora das Graças.


Aproveitando um galpão ali existente, fizemos um lanche, nos hidratamos, depois prosseguimos adiante e logo enfrentamos uma difícil elevação que, ao seu final, nos levou a transitar a 1.300 m de altitude.


Depois de um breve descenso, afrontamos a derradeira aclividade do dia, onde, em seu cimo, atingimos a marca de 1.350 m, o ponto de maior altimetria dessa jornada.


Já em descenso, logo chegamos em zona urbana e ainda debaixo de inclemente chuva, seguimos em direção ao centro da localidade.


Então, após me albergar e tomar demorado banho quente, retornei ao Restaurante O Cumpadi para almoçar com meus bravos companheiros de trilha.


Finda a lauta e festiva refeição, nos despedimos como fazem os bêbados e os velhos companheiros de armas e tenho certeza de que se não fosse por eles, meu Caminho não seria tão colorido e agradável.


Então, o Oswaldinho e o Sérgio, a quem agradeço imensamente pela memorável parceria, adentraram em um veículo e retornaram às suas respectivas residências, enquanto eu voltei ao hotel para descansar e me preparar para a jornada sequente.


Algumas fotos do percurso desse dia:

Com meu "Xará", debaixo de chuva, mas firmes na trilha...

Capela de Nossa Senhora das Graças, localizada no bairro Boa Vista dos Góes.

Imorredouras paisagens mineiras, novamente....

A igreja matriz de Bueno Brandão/MG.

Com meus parceiros de trilha: Sérgio Muroni e Oswaldo Francisco Bueno.

Bueno Brandão tem uma população estimada para o ano 2020 de 10.892 habitantes e seu nome é uma homenagem ao político ourofinense e ex-presidente do Estado de Minas Gerais, Júlio Bueno Brandão. O desbravamento do território foi feito por diversos portugueses residentes na corte do Rio de Janeiro que, no ano da Independência, não tendo aderido ao recém-fundado Império, foram banidos e fixaram residência nas margens do Ribeirão das Antas. A fertilidade do solo e a abundância de águas foram fatores determinantes na ocupação do território e desenvolvimento do atual município (IBGE, 2021). O município é conhecido pelas inúmeras cachoeiras, sendo catalogadas mais de 30. (Fonte: bit.ly/caminhogp)


RESUMO DO DIA: Clima: frio e chuvoso, com temperatura variando entre 12 e 19 graus.


Hospedagem: Hotel Estância Campo Místico – Espetacular! Preço: R$110,00 por um excelente quarto individual. Recomendo esse local, com efusão!


Almoço no Restaurante O Cumpadi - Excelente! – Preço: R$25,00, pode-se comer à vontade no Self-Service.


IMPRESSÃO PESSOAL: Uma etapa de razoável extensão e permeada de variadas alterações altimétricas. Contudo, trata-se de um trajeto agradável e pleno de vistas maravilhosas. No percurso encontrei fazendas de pequenas extensões e variadas culturas agropecuárias, com ênfase para o café, o forte na região. Infelizmente, a chuva não deu trégua nesse dia, porém, tive a felicidade de compartilhar a trilha com meus amigos Oswaldinho e Sérgio, e só por esse detalhe, tudo o mais valeu a pena.


3º dia: BUENO BRANDÃO/MG a BOM REPOUSO/MG – 29 QUILÔMETROS


Que a gente sempre carregue fé, amor e pensamento positivo todos os dias!


O dia estava clareando ao redor das 6 h 30 min e havia chovido muito na região no dia anterior, assim, quando deixei o local de pernoite, às 5 h 30 min, encontrei um clima fresco e ventoso, afinal eu estava a mais de 1.200 m de altitude.


Descendi por ruas vazias e depois de percorrer 1.000 m, acessei a estrada da Guabiroba, por onde segui com a lanterna ligada, sendo que o forte nesse trecho e a criação de gado leiteiro e passei por inúmeras fazendas onde a ordenha matutina estava em pleno vapor.


Por uma hora e sempre em perene ascensão, eu caminhei sobre uma estrada deserta, cujo piso estava sedimentado pelas chuvas recentes, ladeado por extensas pastagens, sob uma temperatura ao redor de 11 graus, agradabilíssima, por sinal.


O dia logo amanheceu e depois de percorrer 13 quilômetros, sempre em lento, mas eterno aclive, passei a caminhar pelo topo da elevação, ladeado por paisagens exuberantes, a perder de vista, no longínquo horizonte.


Prosseguindo, ainda enfrentei outro árduo aclive que, em seu topo, me levou a transitar a quase 1.600 m de altitude, já próximo do Pico da Torre, então, bruscamente, passei a descender e o fiz com extremo cuidado, pois face às recentes intempéries, tudo se encontrava liso e um tombo ali poderia ser fatal.


Uma hora mais tarde, depois de superar um “criminoso” e derradeiro declive, eu transitei pelo povoado de Boa Vereda, que pertence à cidade de Bom Repouso e está situado a 1.176 m de altitude.


O lugarejo se encontra todo cercado por enormes plantações de morango, o forte nessa região e segundo li num site sobre essa localidade: “...trata-se de um lugar tranquilo de gente trabalhadora e simples. Lugar que aquieta o coração de quem vive ou de quem já passou por aqui. Lugar de céu lindo de dia e de noite, com natureza exuberante e de simplicidade e acolhimento perfeito...”


Numa pracinha localizada diante da capela de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do local, fiz uma pausa para hidratação, descanso e ingestão de uma banana, depois prossegui adiante, refeito novamente em termos físicos e os ascensos se prologaram, ininterruptamente.


Eu estava me aproximando, inexoravelmente, do meu destino, de modo que nesse tramo final o trânsito de veículos recrudesceu, afinal, estávamos em plena época da safra do morango e notei muitas pessoas se movimentando nas plantações da fruta, fazendo a colheita diária da saborosa iguaria.


Segui sempre em ascensão e depois de caminhar 24 quilômetros, atingi a marca 1.520 m de altura, então, a partir desse marco passei a descender, sem pausas, e logo avistava Bom Repouso, minha meta para esse dia.


Sem pressa, prossegui adiante aspirando o ar puro emanado de fresca brisa que batia em minha face e logo adentrei em zona urbana, então, segui por ruas movimentadas e, depois de superar outra elevação, logo chegava ao meu objetivo: o Santuário de Nossa Senhora das Graças, onde, livre do peso da mochila, passei um bom tempo no local fotografando e orando.


Infelizmente, como da vez anterior, também encontrei fechada a pequena capela que ali existe, contudo, isto não empanou o brilho de minha visita, pois professei minhas orações do lado externo do templo e, tenho certeza, meus pleitos foram ouvidos pela Mãe da Medalha Milagrosa.


Satisfeito por realizar mais uma etapa com sucesso, me hospedei na Pousada Nossa Senhora das Graças, situada próxima dali, onde seus proprietários, o sr. José Milton e a Dona Cidinha fazem a diferença, pois são extremamente atenciosos e simpáticos.


Algumas fotos do percurso desse dia:

Paisagens mineiras..

Banco situado próximo do Pico da Torre.

Praça central do povoado de Boa Vereda.

Santuário de Nossa Senhora das Graças, em Bom Repouso/MG.

Nossa Senhora das Graças, a vossa bênção e proteção sempre!

A IMAGEM DE NOSSA SENHORA DAS GRAÇAS


O pedestal onde se encontra a imagem de Nossa Senhora das Graças é o segundo maior do mundo já erigido em sua homenagem, pois possuí 20 metros de altura, e se localiza ao lado de um Santuário Mariano.


Ele foi inteiramente edificado em argamassa, equivale a um prédio de seis andares e se encontra a 1.410 m de altitude.


Sua construção data de 2001 e é uma das maiores estátuas da santa no Brasil (em Irati, no Paraná, há uma imagem de Nossa Senhora das Graças de 22 metros de altura).


A iniciativa veio de uma moradora local, muito devota de Nossa Senhora das Graças, e a construção foi realizada com a ajuda de toda a população e da Prefeitura Municipal, com o intuito de atrair turistas para a cidade.


Segundo a municipalidade, o santuário recebe, em média, 40.000 visitantes por ano.


No alicerce da imagem há uma lojinha, onde os turistas e romeiros encontram orações de Nossa Senhora das Graças com folders, santinhos, adesivos, chaveiros religiosos em geral e um pequeno espaço com fotos de pessoas que fizeram seus pedidos e promessas e foram abençoadas, recebendo graças da santa.


Os visitantes também podem visitar a capela ao lado e deixar seus pedidos e ofertas a Nossa Senhora das Graças. 


Bom Repouso tem uma população estimada para o ano 2020 de 10.537 habitantes e seu nome, de acordo com uma lenda, deve-se a uma gigantesca árvore paineira que fornecia sombra para viajantes que passavam por suas terras. As condições climáticas, as propriedades terapêuticas de suas águas e a fertilidade do solo, atraíram novos moradores, descendentes de franceses e espanhóis, originando-se as famílias Andradas, Brandões e Garcias. Posteriormente, os incrementos à fruticultura, à exploração de tubérculos e madeira, à pecuária e culturas agrícolas em geral, determinaram o desenvolvimento da comunidade (IBGE, 2021). (Fonte: bit.ly/caminhogp)


RESUMO DO DIA: Clima: frio e ensolarado, com temperatura variando entre 8 e 19 graus.


Pernoite na Pousada Nossa Senhora das Graças: Apartamento individual espetacular! – Preço: R$90,00


Almoço no Restaurante e Pizzaria Mama Mia: Excelente! – Preço: R$39,90, o quilo no sistema Self-Service.


AVALIAÇÃO PESSOAL - Uma etapa de grande extensão e variadas dificuldades inerentes, face às violentas alterações altimétricas contidas no percurso. Os 13 quilômetros iniciais são sempre em franco ascenso, contudo, sempre ladeados por paisagens espetaculares. O abrupto descenso para o distrito de Boa Vereda é terrível e magoa sensivelmente nossos membros inferiores. O restante do trajeto mescla aclives e leves descensos, mas o ponto maior, sem dúvida, é a visita ao Santuário de Nossa Senhora das Graças, em Bom Repouso. No global, possivelmente, a etapa mais dificultosa desse giro, no entanto, de imensa ermosidade, perene silêncio e plena de deslumbrantes cenários.


4º dia: BOM REPOUSO/MG a BORDA DA MATA/MG – 34 QUILÔMETROS


Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, quem não ouve música e quem não acha graça de si mesmo.” (Martha Medeiros)


À noite fez um frio danado, afinal, Bom Repouso é a 4ª cidade mais alta do Brasil, assim, quando me levantei o termômetro registrava 7ºC, algo desanimador para quem vai enfrentar logo no início da jornada um clima externo agressivo e neblinoso.


Porém, meu espírito peregrino gritou mais alto e às 5 h 30 min quando parti, graças às flexões e alongamentos praticados no quarto de hospedagem, meu sangue já circulava com desenvoltura, assim, percorridos 2 quilômetros, no final de um leve ascenso, eu já transpirava abundantemente.


Com minha lanterna manual ligada, segui sem problemas e percorridos 7 quilômetros sobre piso compactado, ladeado por belas paisagens, passei a descender com violência, sempre por locais de incomum beleza.


Percorridos 10 quilômetros, no final da abrupta declivência, obedecendo à sinalização, eu girei à esquerda e passei a caminhar ao lado do rio Moji-Guaçu, num percurso ermo e silencioso, talvez, o mais belo e agreste de todo esse giro, pois nesse trecho não avistei vivalma, nem cruzei com pessoas ou veículos automotores.


Nele, eu avistei 2 cachoeiras e percorridos 16 quilômetros em ótimo ritmo, animado, cheguei em Tocos do Moji e na entrada da cidade, passei um tempo orando defronte à sua igreja matriz, cuja padroeira é Nossa Senhora Aparecida.


Tocos do Moji tem uma população estimada para o ano 2020 de 4.109 habitantes. O distrito foi criado com subordinação ao município de Borda da Mata. Em meados do século XIX, Pedro Felipe da Rosa, sua esposa Maria Brandina Rosa e quatro filhos chegaram na localidade. Posteriormente, muitos outros parentes vieram do bairro Água Comprida, no município de Cambuí. Em 1917 foi construída uma capela de Nossa Senhora Aparecida, trazida por Pedro Fabrício da Rosa. A existência de muitas e extensas áreas de campos e terra fértil foram os fatores responsáveis pelo impulso inicial e formação do núcleo ou vila (IBGE, 2021). (Fonte: bit.ly/caminhogp)


Eu pensava em fazer uma pausa na simpática Tocos, contudo encontrei uma severa barreira sanitária ali implantada, face à pandemia da Covid-19, então, resolvi prosseguir em frente, desta vez, caminhando pelo leito do Caminho da Fé, no sentido inverso.


O itinerário, já velho conhecido, me levou a transitar por locais de incomum beleza e percorridos 25 quilômetros, me fez atravessar pela “enésima” vez a mítica “Porteira do Céu” e nesse trajeto eu cruzei com 5 peregrinos, cada um num estágio diferente, com quem também dialoguei, ainda que por pouco tempo, visto que o sol já tostava forte.


Antes, no entanto, no 20º quilômetro, me surpreendi emocionado, quando li a lápide inserta numa singela igrejinha, edificada em homenagem ao jovem que ali faleceu, recentemente, logo após completar 30 anos: “A vida é feita de partidas e chegadas, idas e vindas. O que parece ser a partida, para outros é a chegada. Um dia, todos nós partiremos ao encontro de nossos pais.”


Seguindo em frente e sem maiores atropelos ou novidades, aportei em Borda da Mata e seguindo meu roteiro de fé, antes de me dirigir ao local de pernoite, passei um tempo no interior da igreja matriz da cidade, agradecendo a Nossa Senhora do Carmo pelo sucesso de minha “viagem” até aquele local, novamente, livre de percalços ou intercorrências negativas.


Abaixo, algumas fotos do percurso desse dia.

Mais um dia amanhecendo na trilha.

Uma cachoeira inserta no rio Moji-Guaçu.

Imagem fincada diante da igreja matriz de Tocos do Moji/MG.

A mítica "Porteira do Céu"

A praça central de Borda da Mata/MG.

Borda da Mata tem uma população estimada para o ano 2020 de 19.614 habitantes. Vários topônimos foram adotados, mas Borda da Mata, adotado no início da fundação, acabou prevalecendo (IBGE, 2021). O município é cortado pela MG 290 e é nacionalmente conhecido como a Capital do Pijama. (Fonte: bit.ly/caminhogp)


RESUMO DO DIA: Clima: frio e ensolarado, com temperatura variando entre 7 e 22 graus.


Pernoite no Hotel Village: Apartamento individual bom – Preço: R$55,00


Almoço no Restaurante Sal e Pimenta: Excelente! – Preço: R$20,00, pode-se comer à vontade no Self-Service.


AVALIAÇÃO PESSOAL - Uma etapa, também, de grande dificuldade, a começar pela distância percorrida. Depois, o forte descenso existente logo após a cidade de Bom Repouso, que machuca e põe em risco os membros inferiores do peregrino. O restante do percurso, após a passagem pela cidade de Tocos do Moji, afora a extenuante aclividade do morro existente no bairro Capinzal, é praticamente todo em descenso, porém, a intensidade dos raios solares naquele dia, após às 10 h, concorreu para que essa jornada se transformasse na mais difícil e desafiadora que sobrepujei nesse breve giro. De se ressair, contudo, que fui premiado em todo o trajeto por paisagens de excelsa beleza.


5º dia: BORDA DA MATA/MG a OURO FINO/MG – 27 QUILÔMETROS


É graça divina começar bem. Graça maior é persistir na caminhada certa. Mas graça das graças é não desistir nunca!” ( Dom Hélder Câmara)


Seria minha derradeira jornada nesse Circuito e, como de praxe, resolvi sair bem cedo, porque tencionava retornar à minha residência naquele mesmo dia, assim, parti às 5 h 30 min, sob um clima frio e nebuloso, temperatura próxima de 11ºC.


Sem maiores dificuldades acessei o roteiro do Caminho da Fé em sentido inverso e fui, paulatinamente, vencendo as distâncias, caminhando por locais bucólicos e silenciosos, até que o dia raiou e me permitiu curtir com mais propriedade a paisagem circundante.


Entre o 7º e o 8º quilômetro eu enfrentei um forte ascenso, depois o caminho se nivelou e prosseguiu dessa forma até o final da jornada.


Logo após a passagem diante da Capela de Nossa Senhora Aparecida, localizada no 11º quilômetro, eu encontrei dois peregrinos uberlandenses e passei um bom tempo dialogando com o simpático casal.


No bairro dos Romas eu fiz breve visita à belíssima Capela erigida em homenagem a Beata Nhá Chica, depois, seguindo adiante, no 17º quilômetro eu deixei o percurso do Caminho da Fé, fleti à direita e prossegui em direção ao bairro Tabuleiro, num percurso silencioso e deserto.


E, 2.500 m à frente, eu girei, radicalmente à esquerda e em leve ascendência, caminhando por uma estrada larga e sombreada, logo cheguei à MG-290, então, girei à direita e prossegui caminhando pelo acostamento da rodovia por mais 1.500 m.


Na sequência, adentrei à esquerda, acessei a avenida Perimetral e por ela cheguei ao centro de Ouro Fino, onde dei por encerrado meu bem-sucedido giro pelas terras montanhosas do sul mineiro.


À tarde, após um profícuo almoço, tomei um ônibus e retornei à minha residência.


ATENÇÃO: O Caminho de Graças & Prosas se inicia em Inconfidentes/MG e finaliza, oficialmente, na cidade de Ouro Fino/MG. O peregrino ou ciclista deverá, então, se dirigir até a cidade de Inconfidentes para retirada do certificado de participação, porém, quem desejar, pode continuar pelo caminho todo sinalizado até Inconfidentes/MG. Serão mais 9 quilômetros de trecho “bônus”, passando pelo Bairro do Alto de Ouro Fino, onde poderá conhecer a obra de arte Caixa Preta, desenvolvida pelo artista plástico ourofinense Emanuel de Gusmão. Fonte: bit.ly/caminhogp


Algumas fotos do percurso desse dia:

Mais um dia amanhece...

Capela de Nossa Senhora Aparecida, situada próxima do Córrego da Onça.

Caminho sombreado e hidratado.

Trecho final bastante sombreado.

Ouro Fino tem uma população estimada para o ano 2020 de 33.791 habitantes. No ano de 1746, os bandeirantes aportaram na região do Vale do Sapucaí, que compreende atualmente o sul de Minas Gerais e o leste de São Paulo, em busca de ouro, pois supunha-se que as jazidas estavam abundantes. Um destes bandeirantes, o sertanista Ângelo Batista, natural de Pindamonhangaba (SP), descobriu ouro nos ribeirões de Ouro Fino, Santa Izabel e São Paulo. Começou, então, uma disputa entre as capitanias de Minas e São Paulo pela posse da região (IBGE, 2020). (Fonte: bit.ly/caminhogp)


AVALIAÇÃO PESSOAL – Uma etapa de média extensão que, afora um forte ascenso no 6º quilômetro, praticamente, não oferece obstáculos de natureza altimétrica no restante do trajeto. Ademais, no percurso há inúmeros trechos sombreados, uma benção para o peregrino. Ainda, pode-se usufruir de água e banheiro no 11º quilômetro e na Capela de Nhá Chica. No global, uma jornada tranquila, além de extremamente bela e aprazível.

FINAL


Caminhar com bom tempo, numa terra bonita, sem pressa, e ter por fim da caminhada um objetivo agradável: eis, de todas as maneiras de viver, aquela que mais me agrada.” (Jean-Jacques Rousseau)


A frase atribuída a Buda, Toda grande caminhada começa com um simples passo, é um estímulo a ser lembrando quando partimos para realizar um projeto longamente acalentado, seja ele de qualquer espécie ou dimensão.


Nesse sentido, devassar um Caminho inédito sempre se afigura mais desafiador do que percorrer um roteiro já trilhado, porém, como afirmou o poeta da Roma antiga Horácio: Quem começa uma coisa nova já tem metade feita, porque fatores como preguiça, insegurança, medo e ansiedade são características paralisantes que nos impedem de atingir objetivos.


Sobre esse tema, há um poema de Álvaro de Campos, um dos heterônimos de Fernando Pessoa, que diz: Na véspera de não partir nunca, ao menos não há que arrumar malas, nem que fazer planos em papel.


Se raciocinarmos dessa forma, jamais zarparemos e viveremos à margem de concretizar nossos sonhos, então, que tal fazer o tão esperado amanhã chegar, começando por hoje?


Pois, foi inspirado nessas insignes digressões que eu espantei o tédio, o frio e receios intrínsecos, deixei minha residência e fui conhecer o “Caminho das Graças & Prosa”.


E não me arrependi, porque diria que esse novel roteiro me proporcionou momentos de intensa introspecção, bem como me surpreendeu, positivamente, por sua exuberante natureza, silêncio, segurança, sinalização e pelo respeito e lhaneza a mim dispensados em todos os locais por onde perpassei.


Por derradeiro, meus aplausos e agradecimentos sinceros ao brilhante peregrino e Engenheiro Ambiental Rony Corrêa que, de forma intrépida, magnífica e edificante projetou, mapeou e sinalizou esse Circuito, de inolvidável plasticidade e beleza.


Finalizando, lembraria Nietzsche, célebre filósofo e poeta alemão, que assim pontuou:


As longas caminhadas oferecem o palco ideal para o ser humano exercitar o culto que frequentemente faz de sua própria alma, e se encontrar consigo mesmo. Expondo as forças antagônicas que formam o nosso caráter a uma ameaça externa, descobriremos quais os valores que se manifestarão com mais intensidade. Independentemente da pessoa que emerja de tal experiência, o conhecimento dessa personalidade abrirá caminho para uma vida mais densa e verdadeira.


Bom Caminho a todos!


Junho/2021