CAMINHO FRANCÊS -  BREVE HISTÓRIA

CAMINHO FRANCÊS -  BREVE HISTÓRIA

O Caminho Francês é o itinerário mais conhecido e aquele que possui maior tradição histórica.

No final do século XI, o Caminho foi fixado através de uma rota que percorre o norte da Península Ibérica e hoje mundialmente conhecida.

Um dos mais famosos peregrinos medievais de Compostela foi o francês Aymeric Picaud, monge da localidade francesa de Poitou.

É conhecido por ter escrito uma crônica da sua viagem, no ano 1130, minuciosa e detalhada, com dicas e recomendações para os Peregrinos.

Esta crônica, com o título "Guia do Peregrino de Santiago de Compostela", está contida num dos mais preciosos documentos medievais: o Códice Calixtino.

Este relato pode ser considerado um dos primeiros guias de viagens da história.

Aymeric Picaud descrevia a Galíza como um lugar rico em florestas, rios, prados, árvores e fontes, com abundância de pão de centeio e cidra, gado, leite, mel, peixe, ouro, prata, telas e tapetes. 

O Peregrino atual pode identificar no seu percurso por terras galegas grande parte daqueles símbolos de identidade.

“O caminho do peregrino é uma coisa muito boa, mas é estreito. Porque a estrada que nos leva à vida é estreita; por outro lado, a estrada que leva à morte é larga e espaçosa. O caminho do peregrino é para aqueles que são bons: é a ausência de vícios, o impedimento do corpo, o aumento das virtudes, perdão para os pecados, o pesar para o penitente, o caminho dos justos, amor dos santos, fé na ressurreição e a recompensa dos abençoados, uma separação do inferno, a proteção dos céus. Afasta-nos de comidas saborosas, faz a gordura gulosa desaparecer, evita a volúpia, constrange os apetites da carne que atacam a fortaleza da alma, limpa o espírito, leva à contemplação, torna modesto o arrogante, eleva os humildes, ama a pobreza. Odeia a repreensão dos que se movem por ganância. Ama, por outro lado, a pessoa que dá ao pobre. Recompensa àqueles que vivem na simplicidade e fazem boas ações; e, por outro lado, não arrasta aqueles que são avarentos e iníquos das garras do pecado.”  (Codex Calixtinus) 

O Liber Sancti Jacobi, também referido como Codex Calixtinus ou Códice Calixtino (Santiago de Compostela, Arquivo da Catedral, s.n.), é um manuscrito iluminado de meados do século XII. Encontrava-se até recentemente conservado no Arquivo da Catedral de Santiago de Compostela, tendo sido comunicado no dia 5 de julho de 2011, que tinha sido roubado desse local. A 4 de julho de 2012, um ano depois do furto, foi encontrado escondido numa garagem, embrulhado num saco de lixo com, outras raridades da Catedral. Os responsáveis pelo roubo foram um eletricista, ex-funcionário da Catedral de Santiago de Compostela, e mais 3 comparsas.

É conhecido do grande público pelo seu livro V, que se constitui no mais antigo guia para os peregrinos que faziam o Caminho rumo a Santiago de Compostela, incluindo conselhos, descrições do percurso e das obras de arte nele existentes, assim como usos e costumes das populações que viviam ao longo da rota. Os demais livros do códice, contém sermões, narrativas de milagres e textos litúrgicos diversos, relacionados com o apóstolo São Tiago.

           MINHA  PEREGRINAÇÃO

     

Minha aventura começou numa sexta-feira à noite, quando embarquei em São Paulo rumo à Espanha.

No avião, finalmente, com destino à Espanha!

No mesmo voo encontrei a peregrina Mariana Campbell, com quem já fizera contato anteriormente, para dividirmos o valor do táxi que nos levaria a Saint Jean Pied de Port, na França.

Peregrina Mariana Campbell

No dia seguinte, após longo translado pelo aeroporto de Madri, desembarcamos em Pamplona, capital da Navarra.

Em face do adiantado da hora, optamos por pernoitar numa pensão da cidade.

Com a Mariana, na chegada a San Jean!

No dia seguinte, às 9 h 30 min, tomamos um táxi dirigido pelo Juán, com quem a Mariana já fizera contato anteriormente desde o Brasil.

Esse simpático taxista fora recomendado pela ACACS-SP - Associação de Confrades e Amigos do Caminho de Santiago de Compostela-São Paulo (www.santiago.org.br), e se mostrou uma pessoa extremamente amável, tranquila e didática.

Rua Citadelle, ponto de partida para o Caminho. Abaixo, o Arco de São João.

Prudentemente ele dirigiu seu veículo em baixa velocidade, nos mostrando os principais pontos por onde passaríamos em nossa “viagem” de retorno, de forma que, diferentemente do que ocorrera em 2001, não passei mal e nem tive enjoos em vista da aguda sinuosidade das curvas existentes no trecho que transpõe os Pirineus.

Já em San Jean, onde aportamos depois de 1 h 30 min de viagem, após o acerto de contas com o motorista, ele simpaticamente nos acompanhou até o Centro de Acolhimento aos Peregrinos, onde recebemos o carimbo em nossa credencial, e explicações concernentes à primeira jornada de nossa peregrinação.

Posteriormente, a Mariana se alojou no Albergue Municipal, enquanto eu me hospedei num hotel, pois como tenho dificuldades para conciliar o sono em ambientes comunitários, optei por não levar saco de dormir e, consequentemente, pernoitar sempre em pensões, hostais ou, se o caso, em albergues privados.

Rio Nive, que corta a cidade de San Jean.

Mais tarde, nos encontramos para almoçar e, na sequência, passear pela simpática cidadezinha e assim, fazer algumas fotos em seus principais pontos de referência.

Tivemos, então, a oportunidade de conhecer alguns monumentos importantes, além da “Igreja de Notre Dame”, uma construção em estilo gótico, do século XIV e o “Arco de São João”, ambos dispostos na rua principal da Porta de Santiago até a Porta da Espanha, por onde passaríamos no dia seguinte ao darmos início à caminhada.

Lembrando-nos de que ao primeiro passo, mais de um milhão seguiriam até Santiago.

Na realidade, senti que estávamos por demais ansiosos para absorver a beleza desses monumentos de arquitetura.

Não faltariam, contudo, oportunidade para novos castelos, igrejas, pontes e construções de todo porte, a mostrar que a história do Caminho foi também, e principalmente, escrita em pedras. 

Saint Jean Pied de Port é uma belíssima localidade francesa, plantada no sopé dos Pirineus Atlânticos, onde confluem três das grandes rotas jacobeias dentro do território francês: a que parte de Paris, a que vem de Le Puy, e a que procede de Vezelay.

Esta localidade, de grande tradição peregrina, conserva uma cidadela fortificada no alto de uma colina, construída no ano de 1628, e possui uma cidade antiga, situada aos seus pés e, que, sem dúvida, merece ser visitada.

Rua Citadelle, ponto de partida para o Caminho. Abaixo, o Arco de São João

Conta hoje com não mais que 2.000 habitantes e tem como via principal a rue D’Espagne, onde se encontra a maioria de suas casas comerciais.

É também o ponto de partida dos peregrinos, que deixam a cidade passando pela Porta D’Espagne (um arco), cruzando a ponte sobre o Rio Nive, e tomando uma estreita estradinha asfaltada, identificada como “Chemim de Compostela” ou “Route de Napoleón”.

Porta da “Igreja de Notre Dame”, em San Jean.

A Oficina dos Peregrinos fica na rua de La Citadelle, nº 44, e lá o peregrino poderá carimbar a sua credencial e receber um pequeno mapa para não se perder na travessia dos Pirineus.

Mas é, também, de fundamental importância obter com maior precisão a previsão do tempo para fazer a travessia.

O albergue de peregrinos fica no nº 39, e a casa da Madame Debril no nº 27, sendo que existem opções de hospedagem por vários preços, lembrando-se que, exceto os albergues, na França tudo funciona mediante reserva.

Início do Caminho, logo após deixar San Jean.

Muitos peregrinos pernoitam em SJPP, mas atualmente existe a opção de dormir numa casa rural em Huntto (5,2 quilômetros), já caminhando em direção à Roncesvalles) ou no albergue em Orisson (8 km depois de SJPP, também na direção de Roncesvalles).

Lembrando que, nos dois locais, o peregrino somente se hospeda mediante reserva prévia.

Ambas as alternativas têm sido a opção de muitos brasileiros, para atenuar o primeiro dia de caminhada, que é muito duro (caso saiam de SJPP). 

Mais tarde, fui com a Mariana observar o local por onde partiríamos na manhã seguinte, e combinamos nos encontrar diante da igreja de Notre Dame, às 7 horas, para encetarmos a primeira etapa juntos, vez que ela não detinha nenhuma experiência em outros caminhos e poderia ter dificuldades em visualizar as indispensáveis setas amarelas.

Já estava no quarto, preparando-me para dormir, quando me lembrei de pedir proteção ao Santo Apóstolo.

Muita emoção, ao retornar após 13 anos a San Jean. Ao fundo, a rue Citadelle.

Então, recorri às “Orações de Santiago” transcritas em meu caderninho de anotações e com muita fé e devoção, rezei: 

“Apóstolo Santiago,

Escolhido entre os primeiros,

Tu foste o primeiro a beber

No cálice do Senhor,

E tu és o grande protetor dos peregrinos;

Faz-nos fortes na fé

E alegres na esperança,

Em nosso caminhar

De peregrino,

Seguindo o caminho

Da vida de Cristo,

E alenta-nos para que,

Finalmente,

Alcancemos a glória De Deus Pai,

Assim Seja!”