Quarta Etapa: SÃO ROQUE DA FARTURA (SP) a ÁGUAS DA PRATA (SP) – 16 quilômetros

Choveu durante a noite toda, e os pingos tamborilando no telhado sem forro, agiram como sonífero, o que me proporcionou um sono tranqüilo e reparador. 

Quando acordei fazia frio e o céu ainda estava escuro.

A chuva fina que vertia naquele início de manhã anunciava as dificuldades a serem enfrentadas na trilha. 

Às 6 h fui tomar café na casa de meus hospedeiros e, às 6 h 30 min, após calorosas despedidas, parti sob um chuvisco persistente para percorrer o menor percurso feito por ora, em toda minha peregrinação.

A garoa não dava trégua, e a trilha estava lisa e embarrada, obrigando-me a grande esforço para manter o equilíbrio. 

Nessas horas, verifica-se que um bom cajado é imprescindível e de extrema praticidade.

       Sítio maravilhoso - Próximo a Águas da Prata/SP

Com Iracema, na Pousada em Águas da Prata/SP

Com Almiro e Iracema em Águas da Prata/SP

Superando os obstáculos, passei, sucessivamente, pelo bairro das Areias e o Pesk Trutas. Visualizei, nesse trecho grandes plantações de hortaliças e girassóis. 

Logo à frente, a partir do Mirante da Lajinha, o Caminho entra em rápido e contínuo descenso.

Por volta das 9 h fui alcançado por um ciclista de nome Jamil, procedente da cidade de Mogi-Mirim, que também havia pernoitado em Fartura.

Sua bicicleta estava completamente carregada de lama, mas ele, embora com grande dificuldade, ainda conseguia dominá-la. 

Improvisamos uma foto, juntos, para a posteridade e, depois disso, partiu apressado, pois pretendia chegar em Andradas naquele dia.

Assim, prossegui em frente, e observei enormes plantações de pés de café, sem dúvida alguma, a de maior cultivo naquela zona, possivelmente, pela sua fácil adaptação ao clima ali reinante.

Mais à frente, conversei com alguns trabalhadores rurais que demandavam um bananal. Naquela paisagem campestre uma enorme paineira florida se destacava defronte nossos olhos.

Rogerson, um morador daquela paragem, explicou-me que não era à toa que o lugar era nominado de “Sítio  Maravilhoso”, designação, por sinal bastante apropriada, pois o espaço ali é, realmente, de admirável  e prodigiosa beleza.

Às 9 h 30 min, parei diante de um imponente Jequitibá-Rosa para fotografá-lo. 

A árvore, de porte magnificente, faz parte de uma mata nativa a qual se atravessa após trilhar ao lado de duas grandes estufas que são utilizadas para cultivo de flores ornamentais, especialmente as orquídeas.

Às 10 h, em franca descensão, caminhei bastante tempo por dentro de um vasto cafezal e, ao término deste, após um pequeno bosque, avistei a cidade de Águas da Prata, ao longe, fincada num bonito vale cercado de montanhas.

Mais 30 minutos de íngremes e escorregadias ladeiras, e pude, finalmente, adentrar à Pousada do Peregrino, que se localiza próxima a Igreja Matriz da cidade, que é, também, Sede da Associação dos Amigos do Caminho da Fé, cujo Presidente, Sr. Clóvis Tavares de Lima, foi quem gentilmente me acolheu à porta.

Ali me instalei confortavelmente, pois a casa possui 5 quartos com beliches e camas, várias salas, 4 banheiros, ampla cozinha e grande área de serviço. 

Sua capacidade de acomodação supera o número de vinte pessoas, além do que o preço é irrisório.

O fato é que o peregrino sente-se em casa, tamanha atenção que lhe é dispensada pelos idealizadores do Caminho e, também, pela meiguice e amabilidade das funcionárias Tina e Karina.

A cidade surgiu a partir de um povoado, mais ou menos em 1876, quando Rufino da Costa Gavião, descobriu a primeira fonte de água mineral de Águas da Prata, hoje denominada “Fonte Antiga”.

Por influência de forasteiros, vindo à região, em busca de cura e descanso, resultou o desenvolvimento e o progresso dessa terra. 

Conta ela atualmente com 7.250 habitantes, e tornou-se oficialmente Estância Hidromineral em dezembro de 1926. Nela nasceu o Caminho da Fé.

Almocei, fartamente, no Restaurante da Prata, vez que servem apenas almoço, e no sistema self-service. 

Depois, aproveitando que a chuva dera uma trégua e o tempo parecia amainar e estar abrindo, fui dar umas voltas para conhecer a cidade.

Ciente que a etapa seguinte seria razoavelmente longa, sem que durante o percurso houvesse qualquer tipo de apoio no Caminho, aproveitei para providenciar suprimentos.

Quando retornei à Pousada, conheci 5 novas peregrinas, recém-chegadas, que iniciariam a jornada na manhã seguinte. 

Entrementes, eram ainda amadoras nesse tipo de aventura e estavam ansiosas pelo desenrolar dos acontecimentos.

Utilizavam-se de equipamentos obsoletos e inadequados ao mister, além de estarem calçadas com tênis novos e ainda não amaciados. 

Quatro delas estavam na faixa etária de 60 anos, e eram extremamente despojadas e humildes. 

Fizeram-me, de maneira singela, relatos comoventes de sua inquebrantável fé em Nossa Senhora.

Confesso que temi pelo resultado da audaciosa empreitada, mas, fiquei sabendo depois, que desafiando todos os prognósticos e dificuldades, haviam conseguido chegar à Aparecida após 20 dias de caminhada. 

Sem dúvida, um exemplo de tenacidade, dedicação e fé inquestionável em Nossa Mãe Padroeira.

À noite, capitaneados pelo brilho da Sra. Iracema, Assessora direta do Sr. Almiro Grings, o idealizador do Caminho, jantamos todos no Restaurante Skinão, que serve comida farta a preço convidativo, local de grata lembrança, pela ótima recepção auferida.

Fui dormir às 22 h, e às 3 h da manhã, acordei assustado sob o fragor de raios e trovões. 

Logo depois, desabou um rumoroso temporal que, por obra divina, durou não mais de uma hora.

AVALIAÇÃO PESSOAL:

Sem dúvida nenhuma, a etapa mais tranqüila e de menor quilometragem, entre todas que todas que concluí. Trata-se de um percurso fácil e agradável, quase sempre em descenso, que oferece belas paisagens, um colírio para os olhos, conjugado com muito verde em praticamente toda a sua extensão.