FINAL

"Cristo vem caminhar conosco, sentir nossa dor, rir o nosso riso e chorar o nosso pranto. Ele é presença constante em nossa caminhada de ternura, carinho, graça, paz e de bênção."

CAMINHO DE SANTIAGO - O RETORNO

Um pouco mais de cinco meses após o término do primeiro caminho e a ansiedade para o retorno já vai tomando conta, porque sei que não saí de lá: Dei apenas um "até breve".

Minha alma ainda está naqueles recantos paradisíacos, onde as marcas indeléveis de meus pés, muitas vezes maltratados pelo desafio que o caminho nos impõe, ainda permanecem.

Ainda ouço o crepitar das folhas secas dos pireneus e ainda vejo e sinto a placidez dos rios do caminho.

Ainda pressinto as setas amarelas nos livrando das "carreteras" e nos impulsionando para um mundo inimaginável, onde paisagens multicoloridas parecem estar esperando que passemos, para podermos contemplá-las em toda a magnitude.

E, o silêncio das longas horas parece ser quebrado nos povoados, onde os sinos parecem atrasar as badaladas, para esperar a chegada do peregrino.

Pois podem me esperar: Eu chegarei e levarei tudo isso plasmado em minha memória até Santiago de Compostela.

(Depoimento do peregrino José Carminatti)

EPÍLOGO

Até finais da Idade Média, a “Costa da Morte” era o último reduto de terra conhecido, lugar por onde os povos pré romanos acreditavam que as almas ascendiam ao Céu.

Foi este local (Fisterra), mítico e simbólico, que teria deixado boquiabertos os conquistadores romanos ao verem desaparecer o sol por detrás do imenso mar que dali se divisa.

Em termos de peregrinação, é importante ressair que o roteiro até Finisterra, “O fim da Terra”, é diferente de todas as outras rotas jacobeias, porque começa onde a totalidade dos caminhos finaliza: em Santiago de Compostela.

Muitos dos que já alcançaram a glória, após abraçar o busto de Santiago em Compostela, depois de percorrer um dos muitos caminhos até a cidade do Santo Apóstolo, como, por exemplo, o Caminho Francês, o Caminho do Norte, a Via de La Prata ou a Rota do Mar de Arousa e Rio Ulla, não resistem à tentação de permanecer sem ver o fim da Terra.

São 120 quilômetros de beleza pura, passando por Muxía, onde o disco solar fica escondido sob a imensidão do oceano Atlântico, e a roupa usada arde no fogo purificador, lançando as cinzas no mar.

Adeus Finisterra...!!

De minha parte, que aguardei 15 anos para conhecer esse roteiro, quase ouço minhas botas se revirando dentro do armário, tal a vontade de repetir um dia esse caminho.

Sempre me perguntava o porquê dessa tardia decisão, mas pode ser que a resposta venha a cada um a seu tempo.

Saint-Exupéry, por exemplo, chegou às suas próprias conclusões, conforme escreveu em Terra dos Homens:

Assim vai a vida. A princípio, enriquecemos; plantamos durante anos, mas os anos chegam em que o tempo destrói esse trabalho, arranca essas árvores. Um a um, os companheiros nos retiram sua sombra. E aos nossos lutos mistura-se então a mágoa secreta de envelhecer”.

Por isso, minha gratidão a Deus pela decisão tomada, ainda que extemporaneamente, e pelo sucesso na empreitada.

Adeus Santiago! Ou melhor... se Deus permitir, até breve!!

Afinal, o Caminho Jacobeu de Finisterra é a expressão mais fiel do histórico grito do peregrino, que diz bem alto “Ultreia” (Mais além!), por ser, efetivamente, mais para além da “meta Compostela”.

No dia em que retornaria ao Brasil, após assistir à Missa dos Peregrinos em Santiago, como de praxe, fui almoçar no bar Manolo.

Sentia o coração pulsando em festa e beatificamente feliz, com uma sensação de regozijo e euforia.

Eu estava empolgado pelo sonho concretizado e já bisava a reincidência.

Assim, quando deixei a Praça do Obradoiro naquele dia à tarde, ergui meus olhos para as torres da Catedral Compostelana, juntei as mãos e inventei uma prece desajeitada que dizia: Por favor, permita que eu volte!

Bom Caminho a todos!

Junho/2016