8º dia: ITAMBÉ DO MATO DENTRO a IPOEMA: 32 quilômetros

Levantei muito cedo e, após fazer um teste com o velho calçado, me senti satisfeito. 

Assim, preparei-me para a jornada do dia.

Após sorver o café oferecido por meus hospedeiros, parti às 5 h 15 min, envolvido num vento gelado que varria as ruas desertas da bela e simpática cidadezinha.

O silêncio reinante era quebrado, apenas, pelo intermitente cantar dos galhos e do ruidoso ladrar dos cães, à minha passagem.

A rua calçada, em perene ascensão, após um quilômetro, desembocou numa larga e bem conservada estrada de terra, por onde segui, iluminando meus passos com minha lanterna, face à escuridão reinante. 

Pouco à pouco a noite foi sendo vencida e, finalmente o dia clareou, quando, então, já me encontrava no topo da terceira elevação que galgava desde minha partida de Itambé. 

A partir dali, iniciou-se gradativo descenso e me dei conta de que transitava entre grandes fazendas de gado leiteiro.

Num cercado, à direita, bezerros mugiam famintos, enquanto suas mães eram ordenhadas numa mangueira próxima. 

A paisagem, tipicamente campestre foi-se mostrando, lentamente, em toda sua plenitude, por campos extensos e integralmente verdes.

Finalmente, o dia raiou e a temperatura permaneceu agradável, porém, o sol avermelhado no horizonte, prometia, dentro em pouco, sugar todo o orvalho que envernizava as folhas das plantas e proporcionaria, em breve, um calor infernal, queimando toda a epiderme exposta a sua luz candente.

Às 7 h, 10 quilômetros percorridos, quando iniciava uma grande ascensão, o ônibus que partira de Itambé às 6 h 30 min, me alcançou, e o motorista, sabendo de minhas dificuldades físicas, gentilmente, parou o coletivo e perguntou se eu queria embarcar.

Ante minha negativa, seguiu em frente e eu prossegui confiante, sempre ladeado por enormes fazendas, onde o gado era uma constante.

No quilômetro 13, pude vislumbrar à minha direita, as serras do Lobo, dos Linhares e dos Alves, formando um paredão rochoso no horizonte. 

Inclusive, algumas ainda cobertas pela névoa matutina.

No cume de uma colina, avistei, abaixo, o distrito de Senhora do Carmo, cuja sede é Itabira e, logo, passei por sua única e principal rua.

 No bar e padaria São José, aproveitei para ingerir café e comprar água, pois, a que portava, já se findara.

Saindo do pequeno povoado, pude contemplar, plantada no alto do morro, a igrejinha dedicada à Nossa Senhora do Carmo, uma singela construção do século XVIII. 

Logo depois, passei defronte a uma moderna edificação, que abriga o Centro de Tradições desse singelo arraial. 

Ao final do calçamento urbano, com o sol brilhando límpido no céu azul, acessei uma estrada de terra à direita, em pronunciado ascenso, em meio a muito verde. 

Após transpor o topo, transitei, sucessivamente, defronte a dois bares diferentes, sendo, o último, o do Ananias.

Em seguida, por duas pontes distintas, transpus os rios Tanque e Quebra-Ossos, respectivamente. 

O caminho seguiu plano, com sombras acolhedoras em alguns de seus pontos, até um grande cruzamento, onde quem segue à direita chega aos povoados de Ipocarmo e Laranjeiras.

 Eu prossegui à esquerda, exatamente, às 10 h, sob sol abrasador, e meia hora depois, adentrava em perímetro urbano. 

Então, por asfalto, segui até o centro do distrito, que pertence à Itabira.

Ipoema, cujo significado é “ave que canta”, está situada a 40 km de sua Sede e foi fundada em abril de 1893. 

Antes do nome atual, teve várias denominações, até passar a se chamar Ipoema, em 1943, durante o governo de Getúlio Vargas. 

Por essa estratégica povoação, à época dos bandeirantes, passaram tropas de burros e mulas carregados de produtos que abasteciam a região do diamante e, na volta, levavam a riqueza mineral do interior mineiro para o Rio de Janeiro e, de lá, para a Europa.

O bucólico lugar ainda conserva construções da época de sua fundação, como a fazenda da Dona. 

Atualmente, tem cerca de 4 mil habitantes, abrigando rica cultura local, como o Museu do Tropeiro, que contém variado acervo.

Na simpática vila, fiquei hospedado na Pousada Tropeiro Real, que está localizada a 700 m do centro da povoação, sendo um dos estabelecimentos em que melhor pernoitei durante minha aventura. 

Além da ampla e bem cuidada área verde que circunda a sólida construção, e do bom gosto na decoração interior, os quartos oferecem requintado conforto, com ênfase para os lençóis e toalhas, alvíssimos. 

Ali, mantive amistoso contato com o proprietário, Sr. Roneijober Andrade, que além de excelente fotógrafo profissional e jornalista, também é diagramador de uma revista sobre a Estrada Real.

Para refeição, utilizei os modestos serviços do bar da Conceição, pois, naquele dia, surpreendentemente, não encontrei nenhum restaurante aberto no povoado.

Mais tarde, pós profícuo descanso, voltei ao centro do distrito para conhecer sua interessante igreja matriz, dedicada à Nossa Senhora da Conceição, que foi construída entre 1915 e 1934, em estilo eclético.

 Depois, fui visitar o famoso Museu dos Tropeiros, que possui mais de 400 peças em exposição. 

E como aquele data, coincidentemente, era um sábado de lua cheia, no seu átrio estava sendo preparado um palco, onde se realizaria à noite, o festivo evento alusivo à tradicional Roda de Viola.

 Mais tarde, optei por ingerir apenas um lanche e, para tanto, utilizei-me dos serviços da lanchonete do Glauber, situada no segundo piso da estação rodoviária local.

Em seguida fui dormir, pois, a etapa seguinte seria, seguramente, um excelente teste de resistência física, pela larga distância a ser vencida. 

IMPRESSÃO PESSOAL: Uma etapa tranquila, em meio a muito verde, sobre um piso excelente, contando, ainda, com a existência do distrito de Senhora do Carmo na metade da jornada, ponto estratégico para descanso e reabastecimento. Contudo, há de se ressaltar a razoável quilometragem a ser percorrida nesse trecho, além da ausência de sombra em praticamente todo o percurso. 

 9º dia: IPOEMA a COCAIS – 40 quilômetros