6 - PINDAMONHANGABA à APARECIDA

6 - PINDAMONHANGABA à APARECIDA – 28 quilômetros

        

            Seria a etapa derradeira e o sol estava crestando de forma agressiva após as 9 h, de forma que resolvi sair o mais cedo possível da pousada, posto que a noite prometia ser extremamente calorenta.

            Ainda estava ressentido fisicamente pela jornada anterior, mas sabia que as contradições fazem parte do dia-a-dia peregrino.

            Porquanto, o esforço cansa, esgota, dói, mas a sensação de vencer as distâncias, superar as adversidades, alivia todas as dores, da cabeça à alma.

            E, o sono profundo aliado a uma noite bem dormida são capazes de operar milagres.

  Por conta disso, acordei às 4 h e, bem disposto, imaginei partir no horário combinado com o Sr. João, o proprietário da pousada, que me garantiu deixar pronto meu café para às 5 h.

            No entanto, quando esse momento chegou, não percebi nenhum movimento dentro do estabelecimento, muito menos na cozinha, de forma que resolvi caminhar sem desjejum mesmo.

            Porquanto, fruto de minha experiência peregrina, já previra que tal fato poderia ocorrer, de forma que muito "mineiramente”, havia adquirido frutas e uma barra de chocolate, que me serviram de combustível para o trecho inicial.

            Assim, deixei o local de pernoite às 5 h 30 min e logo chegava a uma grande rotatória, onde acessei a rodovia SP-62, na verdade, a antiga estrada que ligava São Paulo ao Rio de Janeiro.

             Então, segui pelo acostamento, no sentido contrário ao fluxo de veículos e bicicletas que, naquele horário se mostrava bastante incipiente.

  Posto que essas, de número expressivo, ocupam uma faixa específica de rolamento nos horários em que se dirigem ao trabalho ou retornam às suas casas, dificultando sobremaneira o deslocamento dos pedestres.

            Assim, caminhar pela manhã, com a brisa fresca a me tocar a face, produziu uma sensação agradável.

            A marcha intensa logo me aqueceu e precisei fazer uma pausa para retirar o casaco, pois eu transpirava em profusão em face do calor reinante.

            A extensa plantação de eucaliptos da Nebrecel Celulose e Papel foi uma das poucas paisagens interessantes que encontrei nesse trecho.

          Lentamente o sol nasceu, o dia foi clareando e às 7 h, depois de percorrer 9 quilômetros, passei pelo bairro de Moreira César que na verdade é um distrito da cidade de Pindamonhangaba.

          Atualmente com 40 mil habitantes, ele é considerado um dos maiores distritos do Estado de São Paulo e detém uma economia maior que a média das cidades brasileiras, apesar de ainda não ser um município.

Peregrinos de Descalvado, partindo de Pindamonhangaba, em direção à Aparecida, onde nós nos reencontraríamos

             No trevo ali existente, observei por um momento a escultura de aço inoxidável “O Guardião de Pìndamonhangaba”, que mostra um soldado com uma lança na mão.       

             Com nove metros de altura, foi um presente da empresa Aço Villares para a cidade, sendo que Belini Romano, funcionário da fábrica e artista plástico, montou a obra em 2.002.

   Depois de transpor a rotatória, acabou a pista dupla e logo encontrei um bar aberto próximo do asfalto, onde aproveitei para ingerir um reforçado café da manhã.

          O proprietário do estabelecimento, notou que eu caminhava sozinho, então, aconselhou-me a ir com bastante cuidado, pois segundo ele, existem inúmeras ocorrências relacionadas com assaltos a peregrinos e romeiros naquela região.

          Para ilustrar, disse que naquela madrugada mesmo, um grupo de romeiros que transitava com um carro de apoio, havia sido rapinado próximo dali, perdendo dinheiro, celulares, bem ainda o veículo que os acompanhava.

            Quase uma hora depois, quando já havia percorrido metade do percurso daquele dia, um táxi que trafegava em direção ao Rio de Janeiro, parou no acostamento, me fez algumas perguntas e, a meu pedido, bateu uma foto minha.

             Depois das despedidas, prossegui solitário e às 8 h 15 min, depois de ter percorrido 19 quilômetros, passei pelo trevo que sinaliza a entrada da cidade de Roseira.

             No céu azul o sol brilhava forte, só de vez em quando era obscurecido por altas e apressadas nuvens brancas.

             O calor já se fazia opressivo, de maneira que fiz uma pausa para renovar o protetor solar, me hidratar e ingerir uma fruta.

             Um misto de alívio e saudade começava a nascer em meu peito, feliz e frustrado por encerrar minha peregrinação.

   Enquanto caminhava, aproveitei para agradecer as generosas e inesquecíveis emoções vivenciadas nos dias anteriores.

            Na sequência, sempre por asfalto, num percurso duro e insosso, às 9 h adentrei em perímetro urbano e logo passava defronte à Pousada Jovimar, um local que costuma abrigar um grande número de romeiros.

         Em seguida, prossegui pela avenida Itaguassu e logo abaixo passei defronte do porto homônimo, local em que a imagem de Nossa Senhora Aparecida foi encontrada no rio Paraíba, no ano de 1.717.

            Um silêncio melancólico passou a oprimir meu coração, em parte motivado pela alegria do ileso aporte ao destino, mas, principalmente, porque sabia que aqueles agradáveis momentos de solidão estavam chegando ao fim.

          Logo à frente, numa pequena elevação, pude avistar os contornos da Basílica de Aparecida e sob forte emoção, exatamente às 10 h adentrava à casa da Mãe Maior.

          Imediatamente me dirigi ao local onde está incrustada a sua imagem e ali, postado em atitude de adoração, recolhimento e intenso contentamento, pude lhe externar minha gratidão pelo sucesso de minha jornada, encerrada sem maiores intercorrências.

             Bem, depois de agradecer minha “Mãe” querida, calmamente fiz uma demorada visita ao majestoso templo, e uma pausa para oração na capela de São José.

   E, para coroar de alegria a peregrinação, me dirigi à Secretaria da Catedral, onde recebi meu segundo “Certificado do Caminho da Fé”, uma láurea por demais almejada.

             Na sequência, bastante extenuado, mas com o coração em festas, me hospedei num hotel localizado nas cercanias daquele imenso complexo religioso.

           À tarde, após degustar um delicioso almoço, retornei ao templo para assistir à missa das 16 h, onde novamente pude externar minha felicidade e renovar meus votos marianos.

           Depois, fui visitar a igreja de São Benedito, uma capela inaugurada em 1.924, de proporção modesta e encimada por uma única torre campanário, que tem como seu maior destaque as figuras de anjos, esculpidas por Chico Santeiro, que enfeitam a porta e os berais da ermida.

 Apesar de singelo, esse templo se transforma durante a festa de seu padroeiro, quando se torna o maior centro de manifestações folclóricas-religiosas do Vale do Paraíba, recebendo milhares de peregrinos devotos do santo de todos os cantos do país.

  É de se lembrar que São Bendito nasceu na Itália e sua fé e dedicação aos pobres, fez dele um dos santos mais venerados do Brasil.

            E no dia seguinte, com o coração em júbilo e sentimento de dever cumprido, retornei ao meu lar.

   FINAL