13ª etapa: PARAISÓPOLIS à LUMINOSA – 24 quilômetros

13ª etapa: PARAISÓPOLIS à LUMINOSA – 24 quilômetros

O Hotel Central me proporcionou excelentes acomodações, porém como seu próprio nome informa, ele se encontra instalado bem no “coração” pulsante da cidade.

A janela do meu quarto se abria diretamente para o “calçadão”, e ali houve barulho e balburdia a noite toda, pois era um sábado, fazendo com que meu sono fosse fragmentado e improdutivo.

Assim sendo, tal qual um “zumbi”, às 3 h eu já estava acordado definitivamente, e assistia à televisão, apenas aguardando o dia clarear.

Dessa forma, imaginem minha surpresa quando cheguei ao vestíbulo do hotel e encontrei o Paulo e o Joy já tomando café.

Explicaram-me que também não puderam conciliar o sono, por conta da algazarra havida durante a madrugada, assim, como eu, pretendiam deixar a cidade o mais rápido possível.

Eu apenas bebi uma xícara de café, posto que já havia ingerido frutas e chocolate no quarto, adquirida no supermercado no dia anterior.

Dessa forma, após novas despedidas, deixei o local de pernoite, exatamente às 5 h 30 min, quando o dia lentamente principiava a clarear.

Por ruas frígidas e silenciosas eu deixei a zona urbana e, quase chegando ao asfalto, pude observar e fotografar um casal de tucanos, que se alimentava num pé de amora.

Depois de transitar por um quilômetro pela rodovia que vai em direção à São Bento do Sapucaí, eu entrei à direita e acessei larga estrada de terra, minha velha conhecida, desde o ano passado.

O clima continuava frio e nublado, propício para caminhar, de forma que marchei num ritmo confortável, enquanto observava a natureza acordando para o novo dia.

Descendo, já próximo da Pousada Casa da Fazenda, extasiado, avistei numa bananeira próxima vários tucanos, calmamente, devorando sua refeição matinal.

Essa ave, bastante encontrada na região, segundo um morador local, possui hábitos gregários, ou seja, vive ordinariamente em bando, e seu alimento predileto são as frutas. 

Ali, juntos, dividindo “o pão”, contei mais de 10 pássaros, fascinado por aquela visão rara e inesperada, num espetáculo surpreendente e multicolorido.

Eu fiquei tão preocupado em fotografar a cena, que ao me mover silenciosamente para trás, acabei por pisar em falso numa pedra.

Esta deslizou e como o piso naquele local era extremamente irregular, eu acabei por escorregar e levar um grande tombo que, por sorte, apenas machucou, ainda que de forma leve, meu joelho direito.

Já refeito, segui adiante por uma estrada deserta e silenciosa, até que às 7 h 30 min, já no bairro São Benedito, 10 quilômetros percorridos, fiz uma pausa para hidratação e aproveitei para retirar a blusa de frio, pois o sol já dera as caras.

Eu estava transitando pelo bairro Áreas, ainda dentro de Minas Gerais, porém mais adiante, eu encontrei um grande poste colorido, exatamente no local que assinala a divisa dos Estados, adentrando eu, então, novamente em terras paulistas, mais especificamente, no Município de São Bento do Sapucaí.

Mais à frente eu parei para orar à beira da estrada, diante de uma imagem de Nossa Senhora de Aparecida, que estava incrustada dentro de um nicho, junto à uma fonte de água.

Então, após mais algumas curvas, principiei a subir a serra do Cantagalo.

Pude observar, como no ano anterior, o riacho Cantagalo que desce a montanha formando pequenas cachoeiras.

E pude apreciar a beleza em todo o entorno, emocionado pelo alegre saltitar da água cristalina nas pedras lisas.

Contudo, neste ano, em face da estiagem, ela tinha seu volume de água bastante diminuído.

Já no bairro Cantagalo, fiz uma pausa para fotografar a simpática igrejinha daquele distrito, depois segui adiante.

Mais acima, após suplantar pequena elevação, encontrei o ponto culminante dessa etapa, a 1.280 metros, exatamente no local em que tornei a adentrar no Estado de Minas Gerais.

Depois, foram mais 3 quilômetros em descenso, com extremo grau de declividade, até que aportei em Luminosa, um povoado encravado no meio de serras abruptas que a circundam por todos os lados.

O lugar me parece perfeito para um retiro, pois se encontra afastado, escondido entre gargantas e profundos desfiladeiros e, definitivamente, quase esquecida no meio da serra.

Como de praxe, me dirigi à Pousada Nossa Senhora das Candeias, e ali fiquei sabendo que Dona Ditinha, a proprietária, havia viajado no dia anterior com seu marido para assistir a um casamento, e só retornaria na segunda-feira.

Porém fui muito bem recebido por sua filha que providenciou o carimbo em minha credencial, bem como me autorizou a subir até o segundo andar, onde eu pretendia fazer curativo em meus pés.

Ocorre que além da queda sofrida, que me magoara o joelho, e das bolhas adquiridas na jornada pretérita, mais um infausto me preocupava, pois sentia meu dedão direito extremamente sensível, por conta da unha inflamada.

Munido de algodão e esparadrapos, refiz cuidadosamente as bandagens, porém, 30 minutos depois, quando resolvi partir, senti que as minhas pernas estavam frias e doloridas.

E como sol e o calor tinham esquentado ainda mais, o meu ânimo arrefeceu definitivamente.

Assim sendo, optei por pernoitar ali mesmo, em consonância a máxima que diz: “O peregrino caminha o quanto pode, não o quanto quer.”

Isto resolvido, eu tomei banho, lavei roupas, depois fui até a igreja de Nossa Senhora da Candelária que, por ser um domingo, estava aberta.

Ao retornar, observei que o simpático distrito vivia um dia agitado e o motivo era uma festividade em homenagem à Santa padroeira do bairro Bonsucesso, localizado próximo dali.

E onde, à tarde, haveria um concorrido desfile de cavaleiros, com a participação de diversas comitivas da região.

Com isto, inúmeros peões com seus trajes domingueiros e típicos chapéus de boiadeiro na cabeça, desfilavam em garbosas montarias ricamente arreadas para a ocasião.

A maior parte desses “cawboys” se aglomerava num bar localizado no entorno da pracinha, onde alegremente “aqueciam as turbinas” antes de seguirem em direção à festa.

Por sinal, no bairro Bonsucesso também se realiza há mais de 20 anos a tradicional Festa da Banana, pois aquele enclave é integralmente tomado por plantações dessa tradicional fruta.

Nunca é demais salientar que o Brasil é o segundo maior produtor mundial de banana, com sete milhões de toneladas, de acordo com a FAO, o órgão das Nações Unidas para agricultura e alimentação.

Só perdendo para a Índia, que com mais de 16,8 milhões toneladas anuais, responde por cerca de 20% do total produzido no planeta.

Atualmente, a banana constitui o quarto produto alimentar mais produzido no mundo, só perdendo para o arroz, o trigo e o milho.

Elas se originaram no sudeste asiático e são cultivadas em praticamente todas as regiões tropicais do planeta, num total de mais de 130 países, por se tratar de uma fonte apreciável de vitamina A e C, além de conter fibras e potássio. (fonte Wikipédia)

Havia, ainda na povoação, um chamativo grupo de motocicletas estacionado defronte a outro bar, onde seus condutores lanchavam tranquilamente.

Conversei com o líder da equipe e ele me contou que haviam percorrido o Caminho da Fé no dia anterior, e pernoitado em Aparecida.

Naquele domingo tinham assistido à missa das 8 horas e estavam retornando para casa.

Para tanto, fariam o roteiro inverso até Águas da Prata, e ali adentrariam no ramal de São João da Boa Vista, seguindo até Aguaí, onde todos residiam, e pretendiam aportar ao redor das 18 horas.

Desejei-lhes boa sorte, me despedi do pessoal, depois retornei à pousada para almoçar.

Após a refeição, por volta das 13 horas, quando eu me preparava para tirar uma soneca, chegaram na pousada o Joy e o Paulo, com a intenção de carimbar suas credenciais e conhecer o estabelecimento.

Conversamos alegremente, batemos algumas fotos, depois eles se abasteceram de água e prosseguiram em frente porque, apesar do horário adiantado e sol inclemente, estavam determinados a pernoitar na pousada de Dona Inês.

Dessa forma, nesse dia eu iria dormir sozinho, tendo ao meu dispor mais de 30 camas para escolher.

Depois de uma boa soneca e quando o sol amainou, fui sentar num banco localizado na pracinha do lugarejo e fiquei a observar calmamente o entorno.

Efetivamente, as agitadas ruas paulistas haviam ficado para trás, aliás, eu nem parecia estar no Brasil.

Ali, todas as coisas estavam em seus devidos lugares.

E sentia uma certa segurança no semblante de cada pessoa, como se o mundo em volta não estivesse girando tão rapidamente quanto nos outros lugares.

Refleti que o valor da vida não está nos momentos de excitação, mas nos intervalos serenos, em que o espírito humano, livre de preocupações, contempla o corpo com a mesma superioridade com que Buda contemplava seu umbigo.

Sem me aperceber, uma tranquilidade gostosa foi descendo sobre minha alma inquieta e soturna.

Mais tarde, aliviado e com o coração em paz, calmamente eu retornei ao local de pernoite.

À noite, optei por ingerir singelo lanche que adquiri no bar do Sr. Edson, e depois logo me recolhi, pois o dia seguinte seria deveras complicado, porquanto eu necessitaria transpor a terrível serra da Mantiqueira, via bairro Campista.

 

AVALIAÇÃO PESSOAL – Uma etapa tranquila, quase toda plana, à exceção da forte aclividade a ser enfrentada na serra do Cantagalo, além do desenfreado descenso até Luminosa. Porém, sempre em meio a exuberantes paisagens, rodeadas de muito verde. No geral, uma das jornadas mais fáceis e belas que enfrentei no Caminho. Não se esquecendo de ressaltar o especial acolhimento que o peregrino recebe em Luminosa, na Pousada de Dona Ditinha.

14ª etapa: LUMINOSA à CAMPOS DE JORDÃO – 36 quilômetros