EPÍLOGO

Peregrinação e viajar conhecer lugares e muitas pessoas, mas na verdade é para conhecer nós mesmos....

Carlos Azevedo, peregrino português

A FORÇA DO CAMINHO!

Que estranha força existe neste caminho, que atrai quem vai para ele, e muito mais para quem já teve a oportunidade de percorrê-lo.

É difícil responder!

Cada um faz o seu caminho e tira as próprias conclusões.

Para mim também, estou sentindo a força do caminho, que fica na memória de quem passa por ele.

Quando vejo as fotografias que tirei, parece um sonho, mas foi pura realidade.

Foi como se eu tivesse deixado este mundo e nascido em outro local, um lugar onde caminhávamos todos na mesma direção, com muita harmonia e bastante companheirismo.

Conheci pessoas de várias nacionalidades, que aos poucos iam fazendo parte desta nova vida, neste outro mundo; eram pessoas que parecia que eu já conhecia há muito tempo, mas, na verdade, eu nem sabia que elas existiam.

Eu comecei o caminho em 14 de maio de 2001, em Saint Jean Pied de Port, e cheguei em Santiago em 12 de junho de 2001; foram 30 dias de caminhada, apenas 2 dias de chuva, muito céu azul e sol, foi uma experiência inesquecível.

Algumas etapas caminhei junto com outras pessoas, mas a maior parte do caminho eu andava sozinho e nos albergues encontrava os amigos.

Quando se caminha sozinho por muito tempo, você tem a oportunidade de ter um contato direto com tudo que existe na natureza e com muita intensidade.

Algumas vezes eu até conversei comigo mesmo em voz alta e a primeira vez que isto aconteceu eu fiquei espantado e achei muito engraçado, mas depois me acostumei.

Em alguns pontos do caminho, dependendo do que você estiver pensando e vendo, a emoção toma conta da situação, mas isso é muito normal e altamente gratificante.

(Autor: Carlos Azevedo, peregrino português)

Gratidão Santiago, por mais esse Caminho mágico!

FINALIZANDO...

Aqueles que aceitam o desafio do Caminho sabem que, enquanto realizam a viagem física, estão concretizando a grande viagem interior do autoconhecimento, de encontro com a própria espiritualidade. Nesse sentido, a condição de peregrino assemelha-se muito à do herói mítico. É preciso abandonar o ambiente familiar e mundano, submeter-se a agruras físicas, correr riscos. Este, entretanto, é um preço que pagam sem queixas, certos de que a recompensa virá. Ao fim da odisseia, voltam renovados, conscientes de que algo mudou internamente.” (Nicholas Shrady)

Quando os jornalistas entrevistam peregrinos em algum caminho sacro, a pergunta é sempre a mesma: quais os motivos que levaram tal pessoa a peregrinar?

Na verdade não existe resposta para essa pergunta, já que os desígnios que estimulam os peregrinos a caminhar são equivalentes ao número de peregrinos no caminho.

Alguns partem por diversão, por esporte, por motivos religiosos ou espirituais, após a perda de um ente querido, para agradecer por algo especial ou por uma graça, depois de conseguir mudar de profissão, após uma mutação de vida ou, simplesmente, porque gostam e se sentem felizes caminhando.

Poucos peregrinos caminham por penitência, ou para pagar uma promessa, mas existem, também, outras instigações, posto que algumas pessoas, a pé ou de bicicleta, percorrem um caminho exclusivamente pelo desafio de fazê-lo, outros porque é moda, alguns porque o cônjuge quer fazer, ou um amigo, ou mesmo um grupo.

Algumas pessoas, numa encruzilhada de suas vidas, fazem um caminho na esperança de "se encontrar", outras têm grandes expectativas sobre um caminho, mas ficam decepcionados com o que encontram.

Outros têm ideias pré concebidas sobre fazer um caminho de uma forma “autêntica” que, presumivelmente, significa da maneira do peregrino penitente, sem dinheiro e contando com o que as outras pessoas lhes oferecem durante a viagem.

Alguns mais já fizeram um caminho, gostaram muito e retornaram, ou procuram percorrer caminhos diferentes.

Com o Francisco, peregrino espanhol, com quem caminhei os derradeiros 10 quilômetros de minha peregrinação. A ele, pela valorosa companhia, minha eterna gratidão!

No meu caso, uma somatória de fatores, motivações e devaneios me estimularam a retornar ao Caminho de Santiago, pela 16ª vez e, também, por outro roteiro inédito.

Nesse sentido, diria que o Caminho de “Inverno” me surpreendeu, positivamente, por suas belas paisagens, silêncio profundo e latente ermosidade.

É certo que as seis primeiras jornadas apresentam trechos duros e desafiadores, contudo, de incomensurável formosura.

Nele, também, desfrutei de solidão, comunguei com a quietude, percorri sendas belíssimas e encontrei pessoas especiais, que me fizeram sentir em casa.

E só repensei meu futuro, apenas, na derradeira etapa, porquanto, a expectativa do final da jornada começa a roubar nossa felicidade, devolvendo-nos ao mundo agitado e ameaçador dos homens.

Felizmente, para o caminhante, nenhum itinerário tem fim.

Posto que, em Santiago meus caminhos nunca se encerraram após a “Missa dos Peregrinos”, na Catedral Compostelana.

Ao revés, eles se perpetuaram em meu interior, cada dia, como um passo novo, subindo e descendo as trilhas da vida!

Bom Caminho a todos!

Novembro/2019

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