13ª etapa – TUDELA à ALFARO – 25 quilômetros

13ª etapa – TUDELA à ALFARO – 25 quilômetros

Coragem é agir com o coração.

A jornada seria tranquila e de pequena extensão.

Além disso, era uma segunda-feira, dia de recomeço no trabalho, exceção para mim que transitaria por novas plagas, localizadas junto à natureza.

Assim, aguardei o dia clarear, pois não havia pressa, e deixei o local de pernoite às 7 horas.

Seguindo o roteiro do Caminho, transitei pelo “casco viejo” da cidade, passei ao lado da igreja de La Magdalena, ultrapassei as vias férreas por um túnel, depois girei à esquerda e adentrei ao Passeio de Cristo, um grande parque natural.

Iniciando mais uma jornada, com muita fé e disposição!

Prossegui por um caminho de terra, tendo o rio Ebro à minha direita e uma rodovia à minha esquerda.

A flecha amarela está no poste, à esquerda.

O caminho plano e arborizado, me levou a transitar entre muitas chácaras, onde o forte era as plantações de hortaliças e culturas de pessegueiros.

Trecho plano e em asfalto.

Posteriormente, 2 quilômetros adiante, o caminho acabou por desaguar na “carretera”, por onde prossegui pelo acostamento, no sentido contrário ao trânsito de veículos.

O sol finalmente deu as caras, e verifiquei que caminhava por uma planície, tendo a via-férrea do lado esquerdo e campos agriculturados do lado direito.

Adentrando ao campo,,,

Percorridos aproximadamente 4 quilômetros em ritmo uniforme, as flechas me direcionaram para a direita da rodovia, onde acessei um agradável caminho de terra.

Lentamente, fui me aproximando novamente do rio Ebro e logo passei a caminhar junto à mata ciliar que protege e acompanha esse espetacular curso d'água.

Adentrando ao Parque Natural.

Na verdade, eu estava me inserindo no Parque Natural de Los Sotos del Ebro, uma extensa área de preservação natural, localizada junto ao rio Ebro.

Eles foram declarados Reserva Natural em 2001 e abarcam uma zona protegida de 476 ha, composta por bosques de ribeira, onde proliferam, principalmente, pés de sauces, álamos, chopos, alisos, fresnos, olmos, dentre outros.

O rio Ebro está do lado direito, logo depois da mata ciliar.

Nele sobrevivem uma grande diversidade de fauna, sendo 13 espécies de peixes, 20 de anfíbios e répteis, 172 espécies de aves e 28 de mamíferos.

Eles desempenham também função de grande importância para as aves migratórias, pois oferecem refúgio e alimentação.

Vista do rio, do lado direito.

O roteiro prosseguiu maravilhoso, ora com rio correndo ao meu lado, outras vezes, caminhando junto às matas ciliares, mas, sempre com amplas culturas agrícolas, à minha esquerda.

Caminho integralmente solitário.

Nesse trecho, alternavam-se plantações de trigo, maiz, entremeados com extensas roças de alcachofras e pessegueiros, o forte nesse trecho.

Apesar do dia radioso, a temperatura prosseguia na marca dos 12 graus, agradabilíssima para caminhar.

Mais uma vista do fabuloso rio Ebro.

Muitas aves cruzavam os céus, e da mata marginal ecoavam os trinados de pássaros menores, todos em busca de companhia, pois estávamos na primavera, época de acasalamento.

Momentos mágicos...

Praticamente não avistei ninguém nesse tramo, embora, por vez, ouvisse o barulho de tratores trabalhando ao longe, que não consegui avistar, por conta da infinidade de pés de frutas existentes no local.

Tudo deserto e silencioso.

Sem dúvida, foi um roteiro fantástico, um dos mais belos que atravessei nesse caminho, tudo muito bem sinalizado e plano.

Fletindo em direção à ferrovia.

Aproximadamente, 4 quilômetros adiante, o caminho fletiu subitamente à esquerda e prossegui, em leve ascenso, em direção às vias férreas.

Quando nelas cheguei, precisei retroceder uns 100 metros para acessar a ponte que transpõe os veículos e pedestres para o lado oposto, pois o roteiro e a rodovia prosseguem por lá.

Ultrapassando sobre a ferrovia por uma ponte.

Para minha surpresa, enquanto fazia tal manobra, avistei um peregrino caminhando a minha frente.

Algo inédito, pois desde minha saída de Deltebre, estivera sempre escoteiro nesse percurso.

Logo o alcancei e prosseguimos um tempo conversando.

Marc, um peregrino alemão, caminha a minha frente...

Tratava-se de Marc, um executivo alemão, que estava em férias sabáticas, segundo me confessou.

Ele saíra de Tortosa, 60 quilômetros à minha frente e, como forma de economizar, pois o roteiro oferece pouquíssimos albergues em seu percurso, levava uma barraca e acampava sempre que necessário.

Por isso, possivelmente, não havíamos nos encontrado até aquele momento, pois ele fugia do burburinho das cidades.

Retorno aos verdes campos...

Conversávamos em inglês, mas logo Marc parou para fumar, acreditem, e nos despedimos.

Tudo plano e reto.

Para sempre, porquanto, nunca mais o avistei no Caminho.

Prosseguindo, acessei uma larga estrada de terra, retilínea e bastante agradável e segui pensando na ironia de estar tão próximo da natureza, e alguém se agredindo internamente, via ingestão do tabaco.

Para mim, o caminho não combina ar puro com poluição interior, mas cada um sabe o que faz.

Quase chegando à cidade.

E, 20 quilômetros percorridos, adentrei em zona urbana e logo estava transitando pelo centro de Castejón, uma cidade de razoável tamanho pelos padrões do caminho, vez que alberga 4200 habitantes.

Seu passado remonta a muitos séculos, por ser a última povoação da Navarra, mas pouco restou de suas ruínas para recontar sua história.

Museu da cidade.

Ali existe um museu, que dedica uma andar para exibir peças recuperadas em escavações arqueológicas, e outra para a história da implantação das vias férreas nessa localidade.

Seguindo as instruções que portava, eu atravessei a povoação perpendicularmente, tendo sempre os trilhos do trem à minha direita.

No final da zona urbana e, após ultrapassar uma rotatória, acessei uma rodovia vicinal, bastante movimentada, por onde discorre o Caminho do Ebro.

Adentrando à Província de La Rioja.

Quase de imediato, uma grande placa ali instalada me informava que naquele local eu estava deixando Navarra para adentrar à Província de La Rioja.

Trecho sobre a rodovia.

Como por encanto, principiaram a aparecer os parreirais.

Imensos vinhedos, do lado esquerdo.

Primeiramente, de maneira tímida, depois, em larga escala.

Acostamento minúsculo..

Afinal, eu estava caminhando por terras, onde se produz o melhor vinho espanhol, berço da uva Crianza, de sabor inigualável.

Adentrando em zona urbana.

Foram 4 quilômetros tranquilos, planos, com pouco tráfego, e logo adentrei em zona urbana.

Avenida que conduz à cidade de Alfaro.

Na entrada da cidade de Alfaro, um monumento homenageia os peregrinos do Caminho de Santiago.

Monumento ao peregrino, situado na entrada da cidade de Alfaro.

No centro da belíssima povoação eu tomei informações e logo chegava ao Hotel Moderno, onde havia feito reserva.

Ali, por 30 Euros, pude dispor de um excelente quarto individual.

Como a jornada fora curta e fazia bastante sol e calor, aproveitei para lavar várias peças de roupas na certeza de que estariam secas à tarde, o que fato aconteceu.

Para almoçar utilizei o restaurante instalado no térreo do edifício, onde paguei 10 Euros por um supimpa “menu del dia”.

Igreja de São Francisco, em Alfaro.

Alfaro se autodenomina “Cidade das Cegonhas” e em sua chegada o peregrino entenderá o porque desse epíteto tão bonito e ecológico.

Seu nome, etimologicamente, parece vir de uma expressão árabe, que quer dizer o farol, fortaleza ou atalaia, o que parece lógico, por sua situação geográfica, que lhe permite a observação de toda a zona da ribeira do Ebro.

Um filho ilustre da cidade.

Chave de Castilla, a cidade tem sido uma testemunha privilegiada da passagem dos séculos, por ser um posto estratégico e, como exemplo disso, em seu município foram encontradas ruínas de um assentamento ocorrido ainda da idade do Ferro (século VIII a.C). 

São Ezequiel nasceu em Alfaro.

Bem como, os restos de Graccurris, a primeira povoação fundada pelos romanos no vale do Ebro, que teve seu auge nas épocas romanas republicana e imperial.

Em 1073, o rei cristão Alfonso I, de Aragón, “El Batallador”, tomou a cidade, reconstruindo suas muralhas, bem como promovendo a construção do primeiro canal de irrigação da região, fato até hoje recordado.

Igreja matriz da cidade: principais dados.

A grande atração da cidade é a Colegiata de São Miguel Arcanjo (XVI-XVII), erigida com ares de Catedral, sendo o maior templo da Rioja, com 3.000 m2 de superfície, declarado Monumento Nacional em 1976.

Igreja matriz de Alfaro.

Na cidade ainda se destacam também o Convento de la Imaculada, a igreja de São Francisco e a ermida de São Roque, bem como por sua importante colônia de cegonhas, que habitam as torres da Colegiata.

População atual: 10 mil habitantes.

A cidade é linda e muito bem cuidada.

As cegonhas são protagonistas da cidade de Alfaro, porquanto mais de 120 ninhos e 500 dessas aves, na época de procriação, habitam os telhados da Colegiata de São Miguel Arcanjo, o maior templo da Província da Rioja.

Ano após ano essa colônia cresce e elas seguem construindo seus enormes ninhos, que podem chegar a pesar mais de 500 quilos.

O prédio onde funciona o Ayuntamiento de Alfaro.

São tantas aves que nidificam nessa cidade, que os 3.000 m2 de telhados de que dispõem na Colegiata se fazem pequenos e, por isso, elas utilizam outras igrejas, postes, torres elétricas, árvores, etc..

Igreja matriz de Alfaro.

A cidade de Alfaro alberga na atualidade a maior colônia urbana por m2 de cegonhas brancas do mundo, exatamente, no teto da Colegiata de São Miguel Arcanjo, declarada Monumento Histórico Artístico.

Nos últimos anos a população de cegonhas na Espanha tem aumentado, mas isto não explica o impressionante e desmesurado crescimento em Alfaro.

Outros fatores também têm influenciado essa expansão, como a proximidade do rio Ebro, o Parque Natural de los Sotos, a vizindade do rio Alhama e, principalmente, as plantações agrícolas do município, pois essas aves se encarregam de eliminar numerosos roedores e outros animais que afetam negativamente as colheitas.

Igreja de São Francisco.

De se ressaltar que as cegonhas não vivem em grandes colônias, porém, Alfaro é uma exceção, e essa modificação de comportamento resulta em outras mudanças.

Vez que, aqui pode se ver como as cegonhas roubam materiais do ninho das outras, e como os filhos mudam de moradia e são aceitos por outros casais.

E a Colegiata é um ponto importante para o estudo dessas aves tão queridas e mimadas nessa cidade.

Local por onde eu deixaria a cidade na manhã seguinte.

Depois de uma retemperadora soneca, fui verificar o local por onde deixaria a localidade na manhã seguinte.

Na volta, fiz uma demorada visita a igreja de São Francisco de Assis.

Igreja de São Francisco, também com muitos ninhos de cegonha.

Em seguida fui visitar a Catedral e fui afortunada pela sorte, pois estava se iniciando uma missa e pude assistir a celebração, e ainda comungar.

À noite lanchei num bar próximo, e logo me recolhi, pois ventava bastante e fazia um frio de doer.

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