06º dia - SANTA MARIA EL REAL DE NIEVA a COCA - 25 quilômetros

06º dia - SANTA MARIA EL REAL DE NIEVA a COCA - 25 quilômetros

Cada caminho pertence a um peregrino, portanto, o "Caminho" é muito diferente para cada caminhante.

A jornada seria tranquila e de pequena extensão, assim, tranquilamente me preparei para mais um dia no caminho, ingeri meu frugal desjejum e deixei o local de pernoite às 7 horas, seguindo 2 quilômetros pelo acostamento da rodovia, até me enlaçar novamente com o roteiro do caminho, exatamente, diante da igreja matriz de Santa Maria.

Com o dia clareando, deixei a zona urbana e logo passei diante da antiga Praça de Touros da cidade, que data de 1848, uma curiosa construção em alvenaria, felizmente, para quem ama os animais, desativada há tempos.

Dois quilômetros adiante, transitei por Nieva, pequena povoação, depois, ultrapassei uma rodovia e me internei, subitamente, num soturno e interminável bosque de pinheiros, onde caminhei por quase uma hora.

Durante todo esse tempo não avistei vivalma e, para complicar, de quando em vez, eu ouvia um ruído sibilante, mas que logo cessava, o que me deixou um tanto curioso e preocupado.

Quando finalmente emergi em local arejado, percebi que a uns 200 m do caminho, passava a via-férrea, então, o barulho provinha do deslocamento de ar provocado pela passagem dos velozes trens pelas linhas da AVE, os quais eu não conseguia avistar, pela aglomeração das árvores.

Depois de rodear uma imensa mina de extração de areia, localizada a céu aberto, segui caminhando entre grandes plantações e, depois de percorrer 14 quilômetros, cheguei em Nava de la Asunción, que atravessei em toda a sua extensão.

A cidade me pareceu próspera e imponente, com belos prédios, casarões, avenidas bem cuidadas, floreiras nas calçadas, enfim, uma agradável povoação.

Nela avistei bares, restaurantes, lojas e outros estabelecimentos comerciais, todos já em funcionamento.

Trata-se de um povoado importante, de traçado moderno, fundado no século XI, que se encontra rodeado por extensos pinheirais, além de explorações agrícolas, florestais e minerais.

Entre seus filhos ilustres, nesse caso, adotivo, cabe mencionar o laureado poeta barcelonês Jaime Gil de Biedma, que passou sua infância e juventude nessa vila.

Prosseguindo, caminhei 2 quilômetros entre trigais, depois, por um túnel, eu transpus as vias férreas e, logo em seguida, submergi em outro extenso bosque de pinheiros, a tônica nessa etapa.

Em alguns locais meus passos foram obstados, terrivelmente, pela quantidade de areia fofa que encontrei no leito da estrada.

Mais 2 quilômetros percorridos, pela primeira vez no caminho, ultrapassei um casal de peregrinos americanos, ao qual cumprimentei efusivamente.

Eu segui adiante, sempre bordejando o rio Eresma, que corria à minha direita, em uma profunda garganta.

E sem maiores novidades, aportei à cidade de Coca, minha meta para esse dia.

Então, segui em direção ao Albergue de Peregrinos e ali telefonei ao Sr. Angel, o hospitaleiro, que rapidamente veio até o local, abriu as instalações do refúgio, registrou minha presença, carimbou a credencial, depois me levou ao 1º andar, onde ficam os dormitórios.

Algumas fotos da jornada desse dia:

Caminhando em direção a Nieva.

Caminho à beira da rodovia...

Adentrando num imenso bosque de pinheiros.

Estrada silenciosa e deserta..

Essa etapa também está muito bem sinalizada.

De volta aos campos abertos.

Uma interessante poesia gravada numa pedra..

Transitando por Nava de La Asunción.

As marcas vão caindo..

Entre trigais, novamente..

Outro bosque de pinheiros, a tônica nessa etapa.

E mais pinheiros...

A vila de Coca, apesar de contar com apenas 2.000 habitantes, possui um patrimônio monumental.

Aqui nasceu Flávio Teodósio I, também conhecido como Teodósio “El Grande” (347-395), o último dos três Imperadores romanos de procedência hispânica. 

Igreja matriz de Coca.

O castelo existente na cidade foi construído no século XV e é um dos maiores expoentes do chamado Gótico-Mudéjar, que nada mais é do que a incorporação de características mudéjares, que emprega materiais construtivos como o tijolo, a cerâmica, o gesso e, na decoração dos tetos, a madeira, nas edificações de caráter gótico.

Desenvolveu-se na Espanha entre os séc. XIV e XV, devido à suntuosidade das construções muçulmanas presentes na península, que tanto agradavam aos monarcas, além do seu baixo custo.

Busto de Teodósio I.

O castelo de Coca foi construído em 1473, por ordem de Alonso de Fonseca, que o converteu em residência senhorial.

A propriedade passou posteriormente para a casa de Alba e, em 1954, foi cedida ao Ministério da Agricultura, para que instalasse uma escola de capacitação florestal, que segue requisitada por alunos de toda a Espanha.

O sistema defensivo do castelo consta de fosso e dois recintos amuralhados, com 4 torres em seus extremos.

A cidade vista de cima das muralhas.

A torre de San Nicolás é a única parte que sobrou da antiga igreja, construída em finais do séc. XII e, em estilo mudéjar, imita os minaretes islâmicos.

Das 8 igrejas que haviam no povoado na Idade Média, apenas a de Santa Maria La Mayor permanece completa.

Finalizada em 1520, no estilo gótico, guarda em seu interior os sepulcros renascentistas da família Fonseca.

As muralhas que envolviam a cidade.

A Porta de Segóvia, data da época da construção da muralha que envolvia a cidade (séc. XII/XIII).

Única sobrevivente das 3 que existiam, permanece de pé, num tramo de 200 metros de comprimento.

Durante séculos, as pedras que constituíam a muralha, foram utilizadas nas reformas de casas, explicando desta forma o pouco que resta de sua estrutura original.

Festejando mais um dia no Caminho...

Em Coca eu pernoitei no Albergue de Peregrinos, instalado numa casa onde, em 1930, residiam Diretores Escolares, situada junto aos edifícios que abrigavam escolas públicas, e que hoje está ocupado pelo Centro Cultural Fonseca e uma biblioteca. Trata-se de uma residência antiga, com um mobiliário e decoração envelhecidos e pesados. Os dormitórios são compostos de 4 quartos, de variados tamanhos, onde estão distribuídos 8 beliches. Os hospitaleiros Angel e sua esposa Charo são extremamente simpáticos e tratam muito bem os peregrinos. Preço do pernoite: 5 Euros.

Para almoçar, utilizei os serviços do restaurante A Muralha, onde despendi apenas 9 Euros, por um excelente “menú del dia”.

IMPRESSÃO PESSOAL - Nessa jornada adentrei à comarca de “Tierra de Pinares”, uma extensa planície que abarca o norte da província de Segóvia e o sul de Valladolid. Em alguns trechos caminhei sob as sombras de pinheirais e por estradas cujo piso, pleno de areia fina, obstou, sobremaneira, meus passos. Para evitar lesões durante esse trecho é melhor caminhar ligeiro, porém sem nunca forçar a marcha. Coca é berço de Teodósio “El Grande”, o último Imperador antes da definitiva divisão do Império Romano.

No geral, uma etapa fácil, tranquila, plana, deserta e silenciosa, tudo o que um autêntico peregrino necessita e venera. A cidade de Coca me surpreendeu pelo seu acervo monumental, que está muito bem conservado. Infelizmente, o albergue da cidade está instalado num prédio antigo e deficiente, e, apesar da boa vontade e simpatia dos hospitaleiros Angel e Charo, necessita de urgentes reformas, mormente, nas rangentes e periclitantes escadarias que unem o andar térreo, onde fica o sanitário, a cozinha e sala de visitas, ao primeiro andar, onde estão os dormitórios.

 07º dia – COCA a ALCAZARÉN - 24 quilômetros