REFLEXÕES FINAIS

Sem dúvida, o Caminho do Norte foi um dos mais belos e emocionantes roteiros que já percorri, pois a maior parte da jornada transcorreu por estradas localizadas entre a montanha e o mar Cantábrico.

Ademais, as trilhas se compõem em quase toda sua totalidade de paisagens atrativas, onde o intenso verdor das elevações, salpicadas de um sem fim de povoações e aldeias que parecem estar perdidas no tempo, se funde com as inumeráveis cores do oceano.

Tudo isso, em um percurso que ainda não se encontra massificado, além de possuir uma gastronomia superlativa, o que converte essa maravilhosa aventura em algo inesquecível para o peregrino.

Hórreo de Carnota, o maior existente em toda a Espanha.

Tanto que hoje, esse roteiro, juntamente com o Caminho Português, se converteu em excelente alternativa para aqueles que desejam fugir de uma Rota muito concorrida, ou busquem uma peregrinação menos trivial e mais espiritual.

No global ele impressiona, sobretudo, por sua beleza natural com as encostas escarpadas, as praias, as bahias e os portos pesqueiros aí encravados como, por exemplo, as inesquecíveis vilas de Luarca e Cudillero.

De se ressaltar, todavia, que seu traçado é bem mais bruto e difícil que o tradicional Caminho Francês.

Posto que, com as faldas da cordilheira cantábrica se despencando de grande altitude até o mar, o caminho, mormente no País Vasco e nas Astúrias, se caracteriza por contínuas escaladas e descidas íngremes, daquelas tipo “tobogã”, que desafiam a resistência física do peregrino.

Acresça-se, que ele discorre por um território com alta densidade urbana, perpassando por poucas cidades grandes ou médias; em compensação, contém extrema urbanização em seu percurso, um reflexo da intensa exploração urbanística intentada na costa espanhola, com consequências desoladoras aos caminhantes.

Nesse sentido, importante ressaltar que dos 828 quilômetros que caminhei, mais de 75% desse montante o foram em asfalto, um tormento para os pés.

E, excetuando-se a Galícia, com uma rede de albergues precária e mal localizada em seu trajeto.

Apesar de todos esses fatores, retornei encantado com a recepção que obtive do povo espanhol que reside ao largo desse roteiro, bem como pelas belas localidades que tive a oportunidade de conhecer, com ênfase especial para a fantástica cidade de Gijón.

Finalizando, julgo oportuno transcrever trecho do depoimento feito pelo peregrino Ulrich Sauter, relativamente à sua peregrinação realizada em novembro de 2009, e publicado no endereço eletrônico: www.caminhodesantiago.org.br: 

“....Comparado ao Camino Francés, o Camino del Norte oferece menor densidade cultural/espiritual /religiosa mas, ainda assim, muitas vezes o espírito de Santiago está presente em lugares como:

- no Santuário de Guadalupe e na Ermita de Santiagotxo (no trecho Irún – Donostia );

- na Placa de Aço no Monte Mendizorrotz (no trecho Donostia – Zarautz), com a inscrição em hebraico do versículo do profeta Isaias 56,1 “Mantende o juízo e fazei justiça...”;

- na Catedral de Vilanova de Lourenzá, que serviu como modelo para a construção da fachada da Catedral de Santiago (de frente para a praza do Obradoiro);

- no Casco Antíguo de Mondoñedo (antigamente uma das 7 capitais administrativas da Galícia ) com sua magnífica catedral de estilo românico do século XIII e, para concluir esta pequena enumeração,

- do imponente Mosteiro Cisterciense de Sobrado dos Monxes (igreja de estilo barroco), onde tive a felicidade de assistir às vésperas cantadas por 20 monges.

Por outro lado, o Camino del Norte nos aproxima à história da Espanha através de vários fragmentos, como por ex.:

- o Monumento a Juan Sebastián Elkano, em Getaria (no trecho Zarautz - Deba), o piloto da frota de Fernão Magalhães, que após a morte do mesmo nas Filipinas, concluiu a primeira circum-navegação do mundo;

- o povoado de Bolibar (origem da família do libertador Simon Bolivar);

- Guernica, com sua trágica história de bombardeio pela aviação alemã na guerra civil da Espanha, onde até hoje o Lehendakari (presidente do governo vasco), faz seu juramento sob o lendário carvalho, “Árbol de Guernica”, antigo símbolo do anseio de liberdade do povo vasco;

- o Porto de Laredo, onde desembarcou o Rei Carlos V na sua última viagem à Espanha, para viver seus derradeiros anos no Monastério de Yuste (Extremadura), fato registrado pelas placas “La Ruta de Carlos V”;

- os inúmeros palacetes construídos pelos “indianos”, emigrantes espanhois do séc XIX que, bem sucedidos (“hicieron las Américas”), retornaram às suas vilas de origem (visitei o emblemático “Archivo de Indianos”, em Colombres);

- a Estátua do conquistador da Flórida, Pedro Menéndez, de Avilés;

- a pintura sobre azulejo contando a vitória dos habitantes de Luarca, sobre a invasão dos normandos no ano 842 ;

Tudo isso, além das deslumbrantes paisagens, enriquece o Camino de Norte, alimenta a mente e amplia nossos conhecimentos, sobre a rica e fascinante história da Espanha.”

Bom Caminho a todos! 

Dezembro/2011